sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

6 - Uma nova Matriz

Em 1949, finalmente, foi criada uma comissão por Dom José Carlos de Aguirre, tendo como presidente Mário Chagas para levantar fundos para aumentar a igreja matriz. No dia 31 de dezembro de 1949, com a transferência de Pe. Ambrósio Marks para Porangaba, a paróquia de Cesário Lange tinha sido anexada à de Tatuí. O Pe. Jorge Mouzizzano, coadjutor de mons. Murari, pároco de Tatuí, passou a assistir a paróquia de Cesário Lange, o que fez desde o dia 15 de dezembro de 1949 até 18 de fevereiro de 1951, quando foi nomeado professor de música para o seminário São Carlos Borromeu em Sorocaba. Para substitui-lo veio a Cesário Lange, outro coadjutor de mons. Murari, Padre Antônio Dragone, que passou a atender a paróquia de Cesário Lange desde então.

A partir de 24 de dezembro de 1951, ele se torna, definitivamente, pároco de Cesário Lange. Pe. Antônio empenhou-se muito em seu novo ministério, restaurou a Cruzada Eucarística e a Obra das Vocações. Um de seus pontos altos de seu paroquiato foi a visita da Imagem Peregrina de Nossa Senhora de Fátima a Cesário Lange entre os dias 25 e 26 de agosto de 1953.

Mas a marca mais importante foi sua atividade em mudar a face da paróquia. Em 20 de abril de 1952, Padre Antônio adquiriu um serviço de alto falantes para a matriz e começou a se empenhar para aumentar a dimensão da velha igreja. Em 14 de março de 1952 tendo em caixa a importância de Cr$ 100.400,00 resolveu começar as obras. Contratou-se o engenheiro José Victor Vieira Pedroso de Tatuí que desenhou a nova planta. Decidiu-se aumentar em seu comprimento em 22 metros e alargá-la em 3 metros de cada lado.

Quanto ao seu alargamento, surgiu aí um problema quanto ao lado direito da igreja que margeava a Rua Padre Gravina. O prefeito de Tatuí, Alberto Santos, doou 4 metros da rua para a ampliação da igreja, que de certa maneira compensava a Paróquia Santa Cruz do “confisco” da praça defronte à Igreja. Entre os dias 13 a 16 de maio de 1952, Dom José Carlos de Aguirre realizou a sua 8.ª visita pastoral à paróquia de Santa Cruz e na tarde do dia 15 de maio abençoou a pedra fundamental da nova igreja. Na manhã seguinte, foi lançada a pedra fundamental na presença do bispo, do pároco, do Padre Murari (vigário de Tatuí), do prefeito de Tatuí, do sub-prefeito, do engenheiro e demais pessoas pelo pedreiro José Benedito Molitor (Zuza). O local onde foi lançada a pedra fundamental fica na sacristia à direita do presbitério da igreja atual.

No entanto, uma dificuldade inesperada surgiu. A Câmara Municipal de Tatuí vetou a doação feita pelo prefeito Alberto Santos. Quase dois anos de negociações se seguiram até que em 11 de maio de 1955, finalmente, a escritura da doação foi lavrada na presença do mesmo prefeito e do Padre Antônio Dragone, como procurador do bispo. Entretanto, uma nova comissão para a ampliação da nova igreja fora criada tendo como presidente Roque Rosa (Mário Chagas falecera em 1954).

Tendo conseguido a regularização do terreno, começaram os trabalhos. De início se pensava em aproveitar a nave antiga da igreja alargando as laterais e aumentando em sua profundidade e na altura de seu teto. Mas verificou-se, logo, tal aproveitamento totalmente inadequado. Praticamente a igreja teve que ser demolida para a construção da nova. Padre Antônio anotava em 1956, que os trabalhos não visavam tanto a arte, mas a utilidade do espaço. Pode-se dizer que, por motivo de economia, a nova igreja foi construída sobre os escombros da antiga, pois tudo foi reaproveitado, desde dos tijolos até mesmo o reboco era peneirado para ser reaproveitado. Por exemplo, o material que não serviu, foi aproveitado para a construção de um pequeno barracão com 11 metros de frente e 15 metros de fundo ao lado da casa paroquial para que se usasse para festas paroquiais e como espaço para aulas de catecismo. Esse barracão foi construído no lugar onde antigamente funcionava à assim chamada "fábrica da igreja", que era o nome que se dava à secretaria da paróquia. Mais tarde, no tempo do Pe. Adolfo Testa, ele se tornou o “Cine São Roque” e hoje é sala de catequese e secretaria da igreja.

Em 1956, Padre Antônio Dragone tornou-se também pároco de Porangaba, mas as obras continuaram até 1958 quando foram interrompidas por absoluta falta de recursos, apesar de estarem bastante adiantadas com todas as paredes erguidas e a igreja inteiramente coberta.

No entanto, um fato novo repercutiu em toda a cidade e que de certa maneira mudou a história da construção da nova matriz. Em 29 de dezembro de 1958 foi anunciada a emancipação política de Cesário Lange que oficialmente foi proclamada em 18 de fevereiro de 1959, mas só em 1.º de janeiro de 1960 tomavam posse o primeiro prefeito e a primeira Câmara Municipal, depois de uma acirrada, às vezes, desleal disputa eleitoral, que mostra a imaturidade política do novo município, que aconteceu em outubro de 1959.

Os dois candidatos a prefeito foram, respectivamente, Roque Rosa e Aristheo Vasconcelos Leite. Venceu o último por uma diferença de 254 votos num universo de 1006 eleitores. Como Roque Rosa fosse o presidente da comissão das obras da igreja, o vigário foi supostamente taxado como simpatizante de sua candidatura, ao menos por alguns seguidores do candidato vencedor. Nos documentos da igreja não há menor alusão a tal possibilidade ou mesmo menção a algum dos candidatos. Parece mesmo, que o padre era totalmente apolítico e estava unicamente preocupado com a vida religiosa de seu povo e da construção da nova matriz.

Entre as várias provocações sofridas pelo pároco devido à nova situação política, dois incidentes lamentáveis devem ser citados: a agressão sofrida pelo padre durante a festa de São Roque no dia 16 de agosto de 1959, no auge da campanha política para as eleições municipais; e a invasão da igreja por parte de um vereador, líder do prefeito na Câmara Municipal, no dia 03 de junho de 1961, quando se celebrava o final do mês mariano.

Este último incidente levou ao afastamento definitivo do padre de Cesário Lange e, portanto da igreja nova pela qual tanto trabalhara. Outros haveriam de continuá-la e terminá-la, talvez, de maneira bem diferente como Pe. Antônio Dragone a havia concebido, embora um acontecimento mais profundo estivesse acontecendo, o Concílio Vaticano II (1962-1965), convocado pelo Papa João XXIII (1958-1963), que traria mudanças profundas na Igreja, inclusive litúrgicas, portanto, alterando de certa maneira a configuração dos edifícios eclesiásticos.

5 - A velha Matriz revisitada

O autor destas linhas (Fernando Antônio Batista de Almeida) entrou pela primeira vez na velha matriz na manhã de um domingo, dia 06 de abril de 1952, levado por seus avós paternos: Durvalino Batista de Almeida (Nhosinho Batista), sua esposa Francisca Rodrigues de Almeida e por sua tia: Elza Batista de Almeida. Tinha, então, somente oito dias de idade, e estava sendo levado à pia batismal, onde o Pe. Antônio Dragone o marcou para sempre como "filho adotivo de Deus" e membro da Igreja de Jesus Cristo ao batizá-lo. Era uma manhã de um domingo importante. Domingo de Ramos! Mais uma vez, a paróquia se preparava para celebrar mais uma Semana Santa, isto é, a morte e ressurreição do Senhor. Portanto, ele convida o leitor destas notas a adentrar naquela manhã de domingo e revisitar a velha igreja com o auxílio da memória alheia.

Ao que parece, quando a paróquia foi criada, a tal “capela-mor” de Santa Cruz reformada por José Mendes de Almeida e Cesário Lange Adrien não teria mais que uns 253 metros quadrados. Durante o paroquiato de Pe. Gravina, construi-se o corpo da igreja, aumentando uns 6 metros em sua profundidade, ficando parte da "capela-mor" como presbitério com duas pequenas sacristias laterais, cada uma das últimas com uns 13 metros quadrados. O presbitério, propriamente dito, era pequeno com uns 25 metros quadrados. O altar-mor era de madeira e colocado junto à parede do fundo do mesmo, como era costume antes da reforma litúrgica do Concílio Vaticano II.

Havia seis altos castiçais sobre o altar, no centro um sacrário também de madeira, sobre ele havia um crucifixo. Em cada lado do altar havia duas colunas, à esquerda com a imagem de Santa Luzia e à direita com a imagem do Senhor Bom Jesus (nos tempos do Pe. Herman von Wolff, eram dois anjos com tochas).

Nas paredes laterais do presbitério havia duas pequenas portas, protegidas com cortinas, que davam acesso às sacristias. À parede esquerda do presbitério ficava pendurada uma luminária a óleo suspenso com correntes, tudo em metal dourado, para indicar a presença do Santíssimo Sacramento.

A nave da igreja teria uns 25 metros de comprimento por 11 metros de largura. No centro da fachada da matriz havia um campanário. Teria a velha matriz, então, uns 324 metros quadrados construídos, que ao longo dos anos foi sendo reformada, ganhando as características, as quais os antigos ainda se lembram e foram conservadas em algumas velhas fotografias.

Pode-se tentar relacionar de maneira cronológica tais melhoramentos. Assim, o Padre cônego José Messias de Aquino (1927-1929), que substituiu Pe. Gravina, forrou a igreja e revestiu suas paredes internas. Construiu, também, dois altares laterais, justamente nos ângulos ao lado do presbitério, um consagrado ao Senhor Bom Jesus e outro a Santa Teresinha, que tinha sido elevada às honras dos altares pelo Papa de então, Pio XI. Mais tarde haveria mudanças.

Nos tempos de Pe. Olegário Barata (1933-1937), foram acrescentados outros dois altares, junto às paredes laterais da igreja e alterados os oragos dos respectivos altares. Assim, no altar lateral à esquerda do altar-mor ficou dedicado ao Sagrado Coração de Jesus e no da direita, a Nossa Senhora do Rosário. Ao longo das paredes laterais, no lado direito, ficava o altar da Imaculada Conceição, tendo ao seu lado um confessionário. Ao longo da parede, à esquerda do altar-mor, ficou o altar de Santa Teresinha e de São Roque, ao lado da porta lateral que dava acesso à rua à esquerda da igreja. Ao lado desta porta lateral havia outro confessionário, já próximo à pia batismal, que ficava justamente à esquerda de quem entrava pela porta principal. Junto à pia batismal havia uma escada em caracol que dava acesso a uma espécie de mezanino, o coro da igreja, onde estavam o "harmonium" e os cantores nas grandes solenidades e na missa paroquial dos domingos.

O coral era de boa qualidade. Em sua terceira visita pastoral entre os dias 04 a 08 de novembro de 1933, nos tempos do Pe. Barata, Dom Aguirre faz um eloqüente elogio ao coral e ficou visivelmente comovido ao ouvir o cantar do hino "Ecce Sacerdos Magnus".

Também ao lado esquerdo do altar-mor, próximo ao altar do Sagrado Coração de Jesus, havia um púlpito, guarnecido de uma escadinha, onde pregava o sacerdote nas missas paroquiais das 10h00 da manhã aos domingos e dias de festa. Separando o presbitério, de teto mais baixo, do resto do corpo da igreja (a única nave) havia a mesa da comunhão com uns cinco metros de comprimento, separada no meio por uma portinhola que permitia a passagem do sacerdote com seus acólitos.

Na nave da igreja havia duas fileiras de bancos, contanto cada fila com quinze bancos. Na igreja, caberiam umas 180 pessoas sentadas. Pe. Barata contratou de São Paulo o mestre Mário Tomasi que pintou as paredes do presbitério. Em 10 de julho de 1933, o mesmo padre melhora a iluminação da igreja com lâmpadas "Coliman" (lâmpadas a gás). Aliás, o problema da iluminação era crítico, pois a igreja tinha poucas janelas e muito altas. Eram quatro janelas na frente, sendo duas ao lado da porta principal, com duas pequenas janelas abaixo da torre. Para iluminar a nave da igreja, havia três janelas em cada parede lateral e a pequena porta na parede lateral esquerda.

Durante sua quarta visita pastoral à paróquia entre os dias 20 e 23 de julho de 1936, vindo de Porangaba, Dom José Carlos de Aguirre abençoou o dínamo do gerador de luz elétrica instalado por Aristides Vasconcellos Neto (1903-1982). Assim a igreja recebia também a luz elétrica (em 1945, Pe. Teotônio dos Reis Cunha, substituindo o vigário Pe. Belotti, agradecia o "empresário" da eletricidade, Aristides Vasconcelos Neto, pois ele deixava de cobrar o serviço de luz da igreja). Substituindo Pe. Barata, veio para Cesário Lange o Pe. Mariano Duarte Peralta (janeiro a novembro de 1937) que em seu curto paroquiato fez notáveis reformas na igreja. Adquiriu-se um outro altar-mor, que pertencia à igreja matriz de Tatuí, obra de um marceneiro chamado Palumbo. Domiciano Rodrigues Paulino e Francisco de Moura se cotizaram para adquirirem o novo altar que custou 650$000. A imagem do Senhor Morto, adquirido em 1927, e que estava debaixo do antigo altar-mor, foi colocado debaixo do altar lateral de Nossa Senhora do Rosário, que tinha, ao lado, a imagem de Nossa Senhora das Dores numa redoma. Francisco Bonifácio de Arruda doou um belo vitral para a janelinha que ficava em cima do altar-mor no presbitério. Em maio de 1937, um novo "harmonium" foi adquirido e o velho, do tempo de Pe. Gravina, que estava em condições deploráveis, foi vendido. Também foi trocado o telhado, reformado o forro, que foi pintado por um pintor anônimo de São Paulo. Um grande lustre de gás acetileno foi adaptado para a luz elétrica no meio da igreja.

Este sacerdote tomou uma iniciativa digna de nota ao entregar alguns aposentos da casa paroquial para que os jovens pudessem jogar e dedicarem a leituras. A iniciativa em sua intenção era boa para combater o ócio e não ter o que fazer dos jovens. Demonstrou-se, no entanto, ser inadequado, o que acarretou o seu fechamento em 1940. Pe. Mariano, em 15 de dezembro de 1937, seria internado na Santa Casa de Tatuí, onde permaneceu internado por 12 dias, gravemente enfermo. Em seu lugar como pároco veio um monge cisterciense que não pertencia ao clero da diocese de Sorocaba, Pe. Raimundo Hillbrand, que continuou com novos melhoramentos na igreja. Em 1938, o padre instala seis lâmpadas para iluminar o "belo" teto da igreja. Reveste, também, as paredes externas da mesma, pintando-as. Adquire novas venezianas para as janelas da torre da igreja.

Em sua quarta visita pastoral, em março de 1942, Dom José Carlos de Aguirre reconhece que a igreja é pequena e sugere que seu corpo fosse aumentado, recuando o presbitério para o fundo, construindo novas sacristias. Terreno para tanto havia, embora com o passar do tempo, o terreno da igreja vinha sendo encolhido.

Um fato pitoresco que vale registrar foi o "confisco" do pátio da igreja em março de 1938 (a atual Praça Pe. Adolfo Testa), que fora doado à capelinha de Santa Cruz no fim do século por Severino Alves de Oliveira com uma área de 7.744 metros quadrados e que foi apossado pela "Câmara", apoiada pela Prefeitura de Tatuí, não obstante os protestos do pároco. Na ocasião, Domiciano Rodrigues Paulino e seu filho, Cesário Rodrigues Paulino, doaram uma boa quantidade de tijolos para que a paróquia protegesse o pouco que lhe restava de seu patrimônio, "antes que outros se apropriem" do resto, como registrava o amargurado vigário, que após relacionar os documentos que tinha e testemunhos, como um jornal de Tatuí de 1926 que noticiava o tal pátio como terreno paroquial, acrescentava em seguida, não com certa ironia: "noli confidere in homine".

No entanto, estava plantada a idéia que algo teria que ser feito. A bela igreja matriz estava com seus dias contados. Os seus curtos dias seriam ainda mais de dez anos até que se juntassem recursos e vontade para construir uma igreja maior.

Por dever de justiça, deve-se fazer um reparo em relação daqueles que lamentam e não se conformam com a demolição da velha matriz para se construir a atual. Respeitando as devidas proporções é a mesma acusação àquela que se faz sobre a demolição da antiga Basílica de São Pedro na colina do Vaticano em Roma, construída pelo imperador Constantino no século IV. Atribuiu-se à "megalomania" do Papa Júlio II (1503-1513) ou a fúria iconoclasta para tudo que era antigo do arquiteto Bramante, isto de acordo, com as simpatias de quem critica. Na verdade, a antiga basílica estava em estado tão deplorável, que não mais suportava reformas e o lugar era único, o túmulo do apóstolo Pedro.

Em Cesário Lange, o motivo parece ter sido bem mais trivial. Havia mesmo um terreno excelente para uma nova igreja, próximo ao campo de futebol, defronte ao cemitério e onde em 1952 se construiu a atual escola “Prof. Francisco Mendes de Almeida”. Foi simplesmente a absoluta falta de recursos para adquirir outro terreno e comprar material novo para construir a igreja nova que levou a decisão de ampliar a antiga, conservando o que já havia. Realmente, tentou-se aproveitar tudo o que desse, das paredes existentes até mesmo o material descartado, o que de fato aconteceu. Só como se verá adiante, as coisas não saíram como era esperado e o belo prédio da antiga matriz se perdeu.

4 - Frei Nuno recorda

No dia 20 de dezembro de 1998, na igreja matriz de Santa Cruz em Cesário Lange, na presença do pároco de então, Pe. Altair Alves de Lima, frei Nuno Alves Corrêa, O.Carm., celebrou uma Missa em ação de graças a Deus pelos 50.º ano de sua ordenação sacerdotal.

Cesário Alves Corrêa, este é seu nome de batismo, nasceu em Cesário Lange no dia 07 de novembro de 1924, filho de Antônio Alves Corrêa (chamado Antônio Lourenço), e Ana das Dores Fiusa (também chamada Aninha Tavares). Ingressou ainda menino, em 13 de fevereiro de 1936, no Seminário Nossa Senhora do Carmo dos padres carmelitas em Itu, onde permaneceu até dezembro de 1942. Em 1943, fez o noviciado na Ordem do Carmo em Mogi das Cruzes. Fez, entre os anos de 1943 a 1948, os cursos de filosofia e teologia na Igreja do Carmo na Bela Vista em São Paulo. Foi ordenado sacerdote em 08 de dezembro de 1948 pelo arcebispo de São Paulo cardeal Dom Carlos Carmelo Vasconcellos Motta. No ano seguinte, 1949, terminou o seu curso de teologia.

Nestes mais de cinqüenta anos como carmelita e sacerdote exerceu muitas atividades no Brasil e também no exterior. Trabalhou em Salvador, BA, em Maroim, SE, nos anos de 1958 e 1959 foi o diretor internacional da Ordem Terceira do Carmo em Fátima, Portugal. Foi pároco da paróquia do Carmo em Santos, Ponta da Praia de 1960 a 1968. Foi diretor do Colégio do Carmo em Santos de 1968 a 1975. De 1978 a 1986 foi o Superior da Província Carmelitana de Santo Elias, residindo em São Paulo. Hoje, reside no Convento da Irmandade Nossa Senhora do Carmo no Rio de Janeiro, onde é Delegado Provincial das Ordens Terceiras, cargo que ocupa desde 1987.
Nota: Frei Nuno Alves Corrêa faleceu no dia 03 de julho de 2008 no Rio de Janeiro.

(Frei Nuno toma a palavra)

No dia 20 de dezembro de 1948, à tardinha, fui recebido na entrada desta cidade e ao som da Banda de Música do Teté (1) cheguei à porta da antiga Matriz onde fui saudado por um nosso conterrâneo o Sr. Antônio Antunes. Momentos antes, o povo recebera o Senhor Bispo Diocesano, Dom José Carlos de Aguirre, que também viera para proceder a uma visita Pastoral, mas ele, delicadamente se escondeu para que o povo desse atenção à minha pessoa.

No dia seguinte, 21 de dezembro, por volta de 9h00 celebrei a Primeira Missa Solene, na antiga Matriz que deu lugar a esta igreja. Recordo-me como se fosse hoje: foi Mestre de Cerimônia o Padre Ambrósio Pabon (2); serviram de diácono, se não me engano, o Monsenhor Castanho (3), hoje bispo de Jundiaí e na época Reitor do Seminário de Sorocaba e como sub-diácono o meu colega Frei Aloísio da Costa Neves, já falecido; foi pregador o Monsenhor Silvestre Murari e numa atitude muito gentil, Dom José Carlos de Aguirre pediu-me para celebrar a primeira missa nesse dia de sua Visita Pastoral.

A missa foi cantada pelo coral do Joaquim da Silva Ribeiro que sempre foi incansável na animação dos cânticos religiosos na Paróquia. Após a missa, houve um almoço na antiga casa paroquial e à tarde, uma tourada, pois o meu padrinho de Crisma, Juvenal Xavier era um apaixonado desse esporte de lazer. O Sr. Cesarinho da Silva Campos e o Sr. Juvenal Xavier (4), respectivamente meus padrinhos de Batismo e Crisma, foram os paraninfos da primeira missa.
O Pe. Ambrósio teve a idéia de organizar uma comissão responsável pela preparação e realização dessa festa de minha Ordenação. Faziam parte da Comissão os Senhores Mário Chagas, Anísio Tavares, Antônio Ribeiro da Silva e o Batista Ribeiro, todos já falecidos; que Deus os tenha na glória. Foi uma festa linda que até agora me dá muitas saudades.

Iniciei em 1950 o meu Ministério Sacerdotal, primeiro no Nordeste, depois no Rio de Janeiro, em Fátima (Portugal), em Santos, em São Paulo e agora de novo no Rio de Janeiro, sempre cumprindo a Missão de Sacerdote em vários campos de atividade pastoral e até exercendo cargos de responsabilidade conferidos pela Ordem do Carmo. Enquanto viviam aqui minha mãe e irmã, Cesário Lange foi para mim sempre o recanto preferido para as minhas férias anuais e visitas freqüentes; a gente nunca se esquece nem da terra em que se nasceu nem de um povo que é tão bom e tão acolhedor.

Nestes cinqüenta anos de sacerdote eu tive a alegria de ver crescer Cesário Lange, acompanhando o seu desenvolvimento, lento, mas determinado e se tornando uma cidadezinha preferida para seus fins de semana de lazer de muitos paulistanos.

Da pequenina igreja que havia em 1948, surgiu esta igreja espaçosa e confortável, graças à presença laboriosa de seu inesquecível pároco Antônio Dragone. Ao Padre Olegário da Silva Barata, da década de trinta, sucederam-se diversos párocos: Monsenhor Teotônio, um dos párocos de Tatuí ainda hoje, Padre Ambrósio, Padre Antônio Dragone, Padre Testa, Padre Chico, Cônego Hilário e agora o bom Padre Altair. Todos eles deixaram a marca de seu zelo pastoral, dando vida à Comunidade Eclesial da qual vocês fazem parte.

A paróquia de Cesário Lange se não é das mais importantes, antes da Diocese de Botucatu, depois da Arquidiocese de Sorocaba e agora da diocese de Itapetininga, ela é, no entanto, uma paróquia muito viva e atuante. A esta paróquia, na medida do possível, durante a minha estadia de férias ou visitas, procurei sempre lançar uma sementinha do Evangelho e procurei despertar vocês para a devoção e o amor a Nossa Senhora do Carmo e seu Santo Escapulário, tanto assim que, pensando no futuro, consegui do Padre Chico a indicação do Bairro do Cruzeiro para sediar a Capela de Nossa Senhora do Carmo que aqui está testemunhando a origem e a passagem de um Frade Carmelita nesta cidade. E o bom povo do Cruzeiro com muito amor e sacrifício aqui construiu a Casa de Maria, Nossa Senhora do Carmo.

A longa distância do Rio de Janeiro, onde estou residindo há mais de dez anos, não me permite mais a freqüência de minhas visitas, mas confesso sinceramente que a lembrança de Cesário Lange e a de vocês, como bom povo conterrâneo, está muito viva em meu coração sacerdotal e nas minhas orações diárias. Eu os sempre recomendo à proteção de Deus e ao amparo de Nossa Senhora.

Terminando esta saudação, dando graças a Deus pelas minhas Bodas de Ouro de Sacerdócio que celebramos neste santo sacrifício da Missa, quero manifestar a vocês todos, sem distinção de pessoa alguma, a minha profunda gratidão por todas as provas de carinho e amor fraterno que de vocês recebi, durante toda a minha vida, desde o meu nascimento, a 07 de novembro de 1924 até o dia de hoje e tenho certeza de que serei alvo desta mesma estima até o fim de minha vida.

Minhas últimas palavras são de fraterna gratidão ao Padre Altair e a todos os fiéis paroquianos que se empenharam na realização desta festa, que não é minha, mas nossa, de vocês, aqui presentes, rezando comigo esta Missa de Ação de Graças. Esta é a mensagem que ditou o meu coração. Muito obrigado. (Frei Nuno Alves Corrêa)

Cesário Lange, 20 de dezembro de 1.998.

***
1) Banda do Teté (Aristheo Vasconcelos Leite). Trata-se da “Corporação Musical Carlos Gomes”, fundada por Teté em 1946.

2) Frei Nuno se engana. Não se trata do Pe. Pabón (Pe. José Antônio Pabón), que passou por aqui em 1945, mas certamente do Pe. Ambrósio Marks, pároco em Cesário Lange de 1942 a 1949.

3) Frei Nuno é traído, certamente, por sua memória. Mons. Castanho, que serviu como diácono em sua primeira missa em Cesário Lange (aliás, ele não tem certeza) não é o atual bispo emérito de Jundiaí, Dom Amauri Castanho, nascido em 1927, ordenado sacerdote em 1951 e bispo em 1976. Dom Amauri foi bispo auxiliar de Sorocaba de 1976-1979, foi transferido para Valença, depois para Jundiaí. Também não se trata de Dom José Carlos Castanho de Almeida, nascido em Guareí em 1930, ordenado sacerdote em 1953 e bispo em 1982, atualmente, bispo emérito de Araçatuba. O mons. Castanho, a quem se refere frei Nuno, pode ser o ilustre Pe. Luiz Castanho de Almeida (embora na época, ele já estivesse doente, é difícil imaginá-lo viajando com o bispo), nascido em Guareí em 06-11-1904, ordenado sacerdote por Dom Aguirre em 08-05-1927, famoso historiador, conhecido pelo pseudônimo literário de Aloísio de Almeida. Mons. Castanho deixou uma obra monumental sobre a História paulista e de Sorocaba. Faleceu em Sorocaba em 28-02-1981. Na opinião deste autor, o sacerdote que serviu como diácono pode ter sido tanto o Pe. Sérvulo de Madureira como o Pe. Vitório Maggioni, que na ocasião acompanhavam o bispo em sua visita pastoral.

4) Juvenal Xavier era o apelido de Juvenal de Arruda Campos (1888-1977), ele é o padrinho de crisma de Frei Nuno. Cesarinho, falecido em 1958, é Cesário da Silva de Campos, filho de Francisco Ribeiro da Silva e Porfíria Maria da Conceição. Ele é o padrinho de batismo de Frei Nuno.




quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

3 - Depois de Padre Pedro Gravina

Entretanto, em 31 de dezembro de 1924, instalava-se a nova diocese de Sorocaba, criada pelo Papa Pio XI em 04 de julho de mesmo ano e neste mesmo dia indicava o Pe. José Carlos de Aguirre de Bragança Paulista como seu primeiro bispo. A nova diocese desmembrava territórios das dioceses de São Paulo (agora, então, elevada à categoria de arquidiocese) e de Botucatu. A diocese de Sorocaba seria formada das seguintes paróquias: Angatuba, Boituva, Bom Sucesso (Paranapanema), Buri, Campo Largo (Araçoiba da Serra), Capão Bonito, Cerquilho, Cesário Lange, Conchas, Faxina (Itapeva), Guareí, Itaberá, Itaí, Itapetininga, Itaporanga, Itararé, Laranjal Paulista, Pereiras, Piedade, Pilar, Porangaba, Ribeirão Vermelho (Riversul), São Miguel Arcanjo, Sarapuí, Sorocaba (com duas paróquias: Catedral e Votorantim), Tatuí e Tietê. Assim, a Paróquia Santa Cruz de Cesário Lange deixava de pertencer à igreja particular de Botucatu para se agregar à nova diocese de Sorocaba.

No dia 31 de março de 1925, o novo bispo nomeou o Pe. Annibal Gravina (1), sobrinho do Pe. Gravina, como seu vigário coadjutor e entre os dias 07 a 08 de junho de 1925, Dom Aguirre fez sua primeira visita pastoral a Cesário Lange. Uma comissão de Cesário Lange foi até Tatuí para trazê-lo em seus "ótimos automóveis". A impressão da paróquia ao bispo foi muito favorável. Ele celebrava a Santa Missa às 7h30 da manhã, em seguida havia a pregação por algum de seus padres missionários, que o acompanhavam. Às 12h00 e 14h00, havia crismas. À tarde, havia a recitação do terço em honra à Virgem Maria com a bênção do Santíssimo Sacramento. Dom Aguirre crismou 877 pessoas, entre crianças, jovens e adultos e legitimou três uniões concubinas. Encorajou o sacerdote a prosseguir as obras para reformar e aumentar o corpo da igreja matriz, que era muito pequena, em seguida seguiu em direção a Porangaba.

Em 28 de julho de 1927, Padre Pedro Gravina deixou o cuidado pastoral da Paróquia Santa Cruz em Cesário Lange para assumir a de São José em Cerquilho. Para substituí-lo, o bispo diocesano, Dom José Carlos de Aguirre, enviou Padre cônego José Messias de Aquino (1927-1929). Seria o primeiro a substituir Padre Gravina. Nos anos seguintes viriam outros. Alguns deles, apenas como temporários ou mesmo como provisionados para determinada ocasião. Se Padre Gravina ficou em Cesário Lange doze anos como pároco, a média de permanência de seus sucessores seria menor. Os que ficaram mais tempo foram: Padre Ambrósio Marks (1942-1949) sete anos e Padre Antônio Dragone (1950-1961) onze anos, ambos, porém, menos que os doze anos do Padre Gravina. O sacerdote que ultrapassará a duração de Padre Gravina como pároco será Padre Francisco de Assis Moraes (1965-1982), permanecendo nesta função por mais de dezessete anos. Neste espaço de tempo, a paróquia Santa Cruz organizou-se como era praxe ao estilo trindentino em volta de irmandades e associações, tendo seus pontos altos nas grandes festas como Natal, Páscoa e festa dos padroeiros. Além de Santa Cruz, a festa de São Roque ganhava projeção, sem dúvida por influência, da área rural próxima a Laranjal e Cerquilho (norte e nordeste do distrito de Cesário Lange), onde se fixaram várias famílias de origem italiana.

Também, neste período, começaram surgir as primeiras capelas rurais. A primeira, ao que parece, foi a São Roque na Fazenda Velha quando o Pe. Olegário Barata era o pároco (1933-1937). No entanto, havia outras comunidades rurais assistidas como a do Rio da Várzea, a do Bairro dos Pedros, a do Bairro das Perobas. Em 1939, o pároco recebe permissão de Dom Aguirre para se utilizar um altar portátil para celebrações da Missa em “lugares decentes”, que estivessem pelo menos três quilômetros de distância da Matriz.

As festas da paróquia, sem dúvida alguma, eram o grande acontecimento no distrito de Cesário Lange. Dentre os paroquianos, geralmente membros de uma das irmandades, eram nomeados os festeiros que organizavam a festa. A parte religiosa consistia em missas matutinas às 7h00 e às 10h00, esta última era a missa paroquial, por excelência: solene, cantada e com sermão. Na parte vespertina: novenas, procissões, pregações, bênçãos do Santíssimo Sacramento. No dia da festa, ela se encerrava com a alvorada tocada por uma banda e uma imponente procissão com andores dos padroeiros, vindos da casa dos festeiros, até à igreja matriz onde se celebrava uma solene "missa cantada". Participavam dela, as bandas de música acompanhando procissões. Houve um tempo, nos anos trinta, que Cesário Lange chegou ter duas bandas: a Santa Teresinha e a Santa Cruz, que desapareceram nos anos da II Guerra Mundial. Em 1946 surgiria a "Corporação Carlos Gomes" fundada por Aristheo Vasconcelos Leite. Havia nestas festas paroquiais animados cururus, touradas e, é claro, os inesquecíveis leilões de lenha em benefício da paróquia (naquele tempo, todos os fogões, mesmo na cidade, eram à lenha), tudo animado por muita queima de fogos e rojões e doces para a criançada.

Para se ter uma idéia do estado da Paróquia Santa Cruz, por volta de 1934, num levantamento diocesano, o pároco de então, o Padre Olegário Barata (1933-1937), informava que a paróquia contava com uma área de 251 km quadrados (uma curiosidade, hoje o município só tem 207 km quadrados), com uma população de 4.127 pessoas, portanto, os mesmos habitantes da época do Pe. Gravina, contando inclusive com uma área rural muito povoada, então, já que toda a economia do município era agrícola, com ênfase no café, no algodão e na pecuária. A área urbana tinha cerca de 200 casas e havia 14 assinantes do serviço telefônico, sendo telefonista a senhorita Ignez de Almeida. O primeiro telefone em Cesário Lange tinha sido instalado em 1911. Os juizes de Paz eram João Quirino Torres e Luiz de Moura, escrivão João Mendes de Almeida, um sub-delegado: Francisco Pires da Fonseca, um sub-prefeito: Dácio Vieira de Camargo e um recebedor municipal: Antônio Antunes da Silva (o Tonho da banda).

Como seria a geografia da vila de Cesário Lange da Paróquia Santa Cruz do Pe. Barata em meados dos anos 30? Imagine o leitor um hexágono, formado por três quadrados em um "L" invertido. Sendo que cada um desses três quadrados, formados por quatro quarteirões. Assim era Cesário Lange, uma vila com 12 quarteirões. Para entender os confins do povoado, consideremos como ponto de partida (ponto 1) a extremidade da Praça da Matriz, então chamada Praça Cesário Lange, onde hoje se encontra a Agência dos Correios. Subimos, atravessando a Rua do Comércio e avançamos pela Rua dos Mendes (um só quarteirão), defletimos para a direita e entramos na Rua Joaquim Ribeiro da Silva (ponto 2), subimos quatro quarteirões até chegarmos à Rua Francisco Ribeiro da Silva (ponto 3), onde defletimos à direita e seguimos por mais quatro quarteirões até à Rua Passa Três (ponto 4), viramos novamente à direita e descemos dois quarteirões até a Rua Aristides Vasconcellos Leite (ponto 5), viramos à direita e avançamos por ela por mais dois quarteirões até chegarmos à Rua José Vieira de Miranda (ponto 6), viramos à esquerda e descemos mais dois quarteirões, onde chegamos a nosso ponto de partida: a extremidade sudeste da atual Praça Padre Adolfo Testa.

Em volta desse hexágono, uma pequena vila, havia numerosas chácaras. Assim, partindo do ponto 1 até a Rua do Comércio, tínhamos a Chácara de Elias Nunes. Da Rua do Comércio, passando pelo ponto 2 até à altura da atual Rua 9 de Julho, havia as terras dos Mendes. Desta altura em diante, havia a Chácara Santa Maria que Durvalino (Nhosinho) Batista de Almeida adquirira de Antônio Antunes e de Nhô Gé onde plantou muito café. Havia a chácara de Manuel Luiz (Maneco Luiz) de Menezes, pai de frei Luiz de Menezes.. Daí em diante, confinando com a Rua Francisco Ribeiro da Silva até o “ponto 4”, eram terras de Porfíria Maria da Conceição, onde moravam seus filhos: Maria Elidia (Marica) casada com Silvino Antunes (que mais tarde vendeu a sua chácara a Mário Chagas), Matheus Fiusa e a chácara de sua mãe Zoraide casada com Jorge Fiusa (genro de Porfíria), que tinha um grande pomar atrás do cemitério. Mais ou menos deste ponto até o ponto 1, eram as terras de Antônio Rodrigues Duarte.

Como se vê, a cidade era muito pequena com poucas ruas. Para ser exato havia as seguintes ruas: Joaquim Ribeiro da Silva, do Comércio, Aristides Vasconcellos Leite, Nove de Julho e Francisco Ribeiro da Silva, todas com quatro quarteirões cada uma. A Rua José Vieira de Miranda só tinha três quarteirões. Havia também mais três ruas, todas com somente dois quarteirões: Passa Três, Quinze de Novembro e Padre Gravina. Enfim, havia a Rua dos Mendes com um só quarteirão.

Não havia luz elétrica, água encanada ou esgoto. Também não havia rádios. Alguns velhos jornais chegavam a alguns mais abastados. O serviço de correio era moroso e muito irregular. As ruas eram de terra batida, as calçadas, quando havia, eram de tijolos, estreitas e irregulares. É provável que nestes anos que as ruas, então existentes, ganharam nomes. Também as estradas que davam acesso à vila não eram pavimentadas. Eram caminhos de terra batida que quando chovia tornavam-se intransitáveis.

Houve um português, Manoel Gabriel Silva, que instalou uma linha de ônibus que ligava Cesário Lange a Tatuí e depois também a Porangaba. Fazia uma única viagem. Ia pela manhã a Tatuí e de lá voltava à tarde. Quando chovia, a jardineira (como era chamada) não corria. Mais tarde, Silva adquiriu um ônibus, o “Pássaro Amarelo”.

Na frente da igreja, havia um grande pátio (onde hoje é o jardim, depois chamada Praça Cesário Lange, hoje Praça Padre Adolfo Testa). Era ali que os meninos na hora do recreio da escola jogavam peão, bolinha de gude (búrica) e futebol. A escola, que no início de Cesário Lange funcionara na atual Rua dos Mendes na casa de José Mendes da Silva (Nhô Gé), em 1922 tornava-se "Escolas Reunidas de Cesário Lange", então em novo endereço: na Rua Joaquim Ribeiro da Silva (onde hoje está a casa de Maria Inês Garcia). Por exemplo, em março de 1923, a escola contava com 132 alunos (80 meninos e 52 meninas) e seu diretor era Licínio Alves Cruz e tinha mesmo um grupo com 33 escoteiros comandado por Francisco Pires Fonseca. Em 1.º de fevereiro de 1934 instalou-se o “Grupo Escolar de Cesário Lange”. Ele foi construído justamente de frente ao Pátio da igreja, num terreno que a Paróquia doou para tal fim (onde hoje é o escritório do Jota). Tinha o novo grupo escolar quatro salas de aula e 152 alunos em sua inauguração. O diretor era Oswaldo Arruda Stein e as professoras: Noêmia de Moura, Cacilda Rodrigues de Almeida, Ernesta Xanira Rabello e Maria Cândida Pinto. Eram de Tatuí e de São Paulo. As de Tatuí, vinham na segunda-feira e só voltavam para lá no sábado à tarde. Vida dura era a delas, que além das aulas, nada tinham mais para fazer. A única pessoa da cidade no Grupo Escolar de Cesário Lange era o servente: Cesário Martins Ribeiro. Pe. Olegário Barata informava também em 1936, que o Grupo Escolar tinha 146 alunos que recebiam instrução religiosa dos seguintes professores: Nícia Fiusa, Luiz Passos, Etelvina Passos, Anna Bandeira e Benedita Ferraz. Havia também seis escolas rurais, chamadas isoladas, onde se administravam ensino religioso. Eram as seguintes: Bairro dos Pedros com 35 alunos, prof.ª Mathildes Cruce, Fazenda São José com 27 alunos com a prof.ª Guiomar Lara, Fazendinha com 37 alunos com a prof.ª Odette Oliveira Barbosa, Fazenda Monte Alegre com 25 anos com a prof.ª Hero Sá, Bairro Aleluia com 20 alunos com a prof.ª Inajá Gabajuna Azevedo e Fazenda Velha com 32 alunos com a prof.ª Maria Eulália Proença.

A rua principal era a “Rua do Comércio”, também chamada de Rua Direita ou Rua do Meio, que não ia além da Rua Francisco Ribeiro da Silva, dali em diante era o caminho que levava ao cemitério paroquial. Nesta rua sobressaía o sobrado de Cesário Ribeiro de Campos, onde funcionava a Casa Fonseca (de Francisco Pires Fonseca). Na Praça da Matriz, além da igreja, havia também um casarão que chamava a atenção, a de Domiciano Rodrigues Paulino (onde hoje, funciona a Prefeitura). Havia próximo ao cemitério um campo de futebol. Cesário Lange contava com um time de futebol o S. C. Ipiranga, que surgiu em 1924 e teve até mesmo um grande jogador de futebol: Jocelin Fiusa. Era ali a saída para Pereiras, uns 100 metros além do cemitério, dobrava à direita e subia mais ou menos na direção da atual Rua Sete de Setembro em direção à Cruz Preta. Atrás do cemitério ficavam as chácaras de Nhá Porfíria e de Zoraide Fiusa (sua filha) que chegavam até a atual Rua Francisco Ribeiro da Silva. A cidade se estendia um pouco mais em direção da Rua Nove de Julho, mas não passava além da travessa da Rua Passa Três. Lá adiante, onde hoje é a Estação Rodoviária, instalou-se aqui a primeira indústria, uma fábrica de queijos, que pertencia a um certo Rodrigo Barretti, mais adiante, havia o matadouro. As casas eram uma distante das outras, com enormes quintais, onde havia desde pomares até criação de galinhas e até mesmo chiqueiros de porcos. Cada casa tinha seu poço e no fundo do quintal, a latrina, as tais privadas. Pode-se imaginar que esta promiscuidade entre poços e latrinas não era nada higiênico. Foi Rafael Garcia que se pôs a construir umas casinhas em direção do cemitério e a vendê-las, dando um aspecto mais compacto à cidade.

A cidade era silenciosa, raros automóveis (uns quinze fordinhos bigodes), mas muitas carroças. Carroças carregando lenha, milho, café e principalmente algodão que desta maneira era levado a Tatuí. Quando Joaquim e Ismael Galvão apareceram por aqui com um caminhão Ford V8 para transportar algodão foi um acontecimento e tanto. As noites eram escuras, alumiadas pelos lampiões a querosene ou fifós dentro das casas e quando a noite caia, a iluminação era da lua e das estrelas. Em julho de 1936, Aristides Vasconcellos Neto (1903-1982) instalou um dínamo movido a óleo diesel para fornecer luz à vila. Quando escurecia, ligava-se o motor que funcionava, no início, até a meia-noite. Com a explosão da II Guerra Mundial, começou o racionamento de combustível e as horas de iluminação foram sendo reduzidas gradativamente, até que ultimamente, aí pelas 21h30 a cidade já estava às escuras. O sinal era conhecido: havia duas “piscadas” na iluminação. Era o aviso do “apagão”. Uns cinco minutos depois, a cidade mergulhava na escuridão. Este serviço durou até 1952, quando foram instalados os postes e a eletricidade passou a vir de Tatuí, fornecido pela “Empresa Luz e Força Elétrica de Tietê S. A.” e “Cia Luz e Força Tatuí” de Paulo San Juan.

Neste terrível conflito, a II Guerra, apesar de sua insignificância, Cesário Lange teve quatro jovens recrutados que serviram como pracinhas na Itália. Foram eles: Roque Rosa, José Roque Soares (Zé Amâncio), João de Arruda, José Maria Saturnino de Assis (Zé Valério). Os quatro voltaram. O último, no entanto, trouxesse consigo seqüelas do conflito, que provocaram sua morte precoce em 1973. Quanto aos outros três, só Roque Rosa está vivo. João de Arruda que desapareceu em agosto de 2002 misteriosamente em Guareí, onde vivia (seu corpo jamais foi encontrado) e José Roque Soares já não mais se encontram em nosso meio. (No dia 14 de dezembro de 2004, Roque Rosa faleceu em Cesário Lange.)

As rezas na igreja eram bem participadas. A igreja abria às 6h00, Pe. Barata celebrava missa às 7h30, às 12h00 o sino tocava, anunciando o “Angelus”. Às 18h45, rezava-se o terço com ladainhas e ministrava-se 45 minutos de catecismo. Durante alguns meses, como maio e outubro havia procissões todas as noites. Aos domingos, havia duas missas: as 7h00 e às 10h00, que era a missa paroquial, cantada e com sermão. Às 12h00, havia a reunião com as irmandades.

Uma atração da vila era o rufar do bumbo convocando os músicos para o ensaio de uma das bandas. Suas casas de ensaio ficavam cheias de pessoas, que iam ouvi-las e apreciar a boa música. Quando chegavam as festas dos padroeiros da paróquia era o momento alto da cidadezinha, quando se juntava a devoção à diversão, isto é, a igreja à banda. Houve, por este tempo também, mesmo um cinema, propriedade de João de Deus Mendes, o Cine Santa Cruz, que parece que teve uma vida muito efêmera. Havia também muita paixão por brigas de galo, corridas de cavalo e futebol, é claro. Para jogar no campo do adversário, os jogadores iam a cavalo.

Em volta da cidade, havia as fazendas com suas particularidades. Havia o Sítio Irmãos Mendes, na verdade uma fazenda enorme de mais de 150 alqueires de terra que pertencia a José Mendes da Silva (Nhô Gé) e seus irmãos, com uns 30 alqueires de algodão e o resto só mato, que era o orgulho do velho Nhô Gé. Havia a Fazenda Monte Alegre do Paraíso, na Água Branca, de Domiciano Rodrigues Paulino com muito algodão e café. Lá moravam cinco famílias para o cultivo da terra. Seu filho Cesário Rodrigues Paulino era proprietário do sítio vizinho, o Santa Benedita de muito café também. Havia a Fazenda São Joaquim na atual Fazendinha onde por volta de 1915 uns italianos, liderados por Giovanni Polesi (1857-1937), natural de Treviso, Itália, com seus filhos, entre eles Pedro, Ângelo, Lucas e Domingos Poles, a adquiriram de Raul Arruda. Ajuntaram-se a eles outros italianos ou descendentes como os Trevisan, os Rossi e mesmo alguns espanhóis, os Perez. Acima de todas, havia a Fazenda mais próspera do lugar: a Fazenda Monte Alegre (cuja sede é a atual EMA - Resort Sabrina) de Raul Arruda e Francisco Bonifácio Arruda com 200 alqueires de terras, onde moravam perto de trinta famílias que cuidavam de um excelente cafezal. Lá se instalou por volta de 1927 um enorme motor a vapor para beneficiar café. Durante a crise de 30, o administrador da fazenda Durvalino (Nhosinho) Batista de Almeida (2) ao invés de queimar o cafezal e dispensar todos os colonos (o que todo mundo estava fazendo), optou para o cultivo alternativo de outros cereais nas "ruas" do cafezal. No lado sudoeste de Cesário Lange, nos lados do ribeirão do Aleluia, ficavam as fazendas dos Mirandas, filhos de José Vieira de Miranda (3) que se instalara nesta região no fim do século XIX. Também, aqui predominava a pecuária e havia muito mato.

Este era o lado idílico e bucólico de Cesário Lange. Havia também o outro lado, o lado obscuro: o lado da fragilidade humana e principalmente das desavenças políticas, onde não faltaram brigas, tiroteios e mesmo mortes. Por exemplo, quando mudavam os ventos da política em Tatuí, por aqui chegavam as trovoadas e nestas tempestades, às vezes, sobrava alguma coisa até para o vigário. Parte essa que, definitivamente, não faz parte desta crônica da paróquia de Cesário Lange.

Tinha também a paróquia de Cesário Lange uma capela rural organizada, a de São Roque da Fazenda Velha (instalada em agosto de 1933). Por esta mesma época, informava o dito pároco, contava em Cesário Lange as seguintes associações religiosas anexas à paróquia: Apostolado da Oração, criada em 25 de junho de 1915, com 27 zeladores e 215 associados; Irmandade do Rosário Perpétuo, criada em 12 de fevereiro de 1914 (sic), com 31 zeladores e 216 associados; a Congregação da Doutrina Cristã, criada em 25 de dezembro de 1917 com 29 associados; Irmandade do Santíssimo Sacramento, criada em 04 de março de 1931, com 70 associados e a Pião União de Filhas de Maria, criada em 15 de junho de 1933, com 14 associadas. O mesmo vigário criaria, em seguida, a irmandade dos Congregados Marianos e a Cruzada Eucarística, esta no dia 1.º de novembro de 1936.

Vale registro um fato que até hoje não foi resolvido a contento. Como é sabido desde 1885 aproximadamente, através de doação feita à capela Santa Cruz de um terreno por parte de Vicente da Silva Ribeiro, a vila de Passa-Três contava com um cemitério que pertencia à igreja. Em agosto de 1922, devido à necessidade de mais espaço para a necrópole paroquial, Porfíria Maria da Conceição (4), nora do doador do terreno primitivo, ao saber que Pe. Gravina queria aumentar seu espaço, doou à paróquia um celamim de terra adjacente ao cemitério. Onze anos mais tarde, precisamente no dia 27 de março de 1933, o prefeito de Tatuí, Joaquim Assumpção Ribeiro (1930-1933), anunciava ao Pe. Manuel Antônio da Silva Leite, então pároco de Cesário Lange, que a partir do dia 1.º de abril daquele ano, a Prefeitura de Tatuí assumia a administração do cemitério. Fato este que gerou uma crise, pois parece que o padre estava de acordo com a decisão, mas parte da população, não. Denunciado ao bispo, Pe. Manuel foi transferido para Tietê. Pesava sobre ele o fato de não ter competência para tanto, pois o cemitério era um patrimônio da paróquia e não do padre. Realmente, em 23 de fevereiro de 1934, a mesma Porfíria Maria da Conceição, através de escritura pública, lavrada no 2.º Tabelionato de Tatuí (Livro 41, fls. 9) regularizou a doação do celamim de terra ao cemitério feita oralmente ao Pe. Gravina, doando à Paróquia Santa Cruz e não à Prefeitura de Tatuí.

No entanto, deve-se fazer um esclarecimento necessário: ao que parece, a questão do cemitério foi o pretexto para o afastamento do padre, pois o que havia mesmo era um fato político. Pe. Manuel era um homem reservado e amigo de algumas famílias de Cesário Lange que eram partidárias da nova ordem desencadeada pela revolução de 1930 e parece que outras famílias influentes se inclinavam pela República Velha sob a batuta dos chefes políticos de Tatuí. O fim de seu paroquiato antecede também à mudança de prefeito em Tatuí e o novo prefeito, João Gândara Mendes, que era casado com uma filha de Francisco Fonseca, nomeia também um outro subprefeito, no caso, Dácio Vieira de Camargo. Tratava-se de outra reviravolta política na cidade.

Na verdade, a venda de posses temporárias (sete anos) e perpétuas de lotes do cemitério era a única renda da paróquia, além das espórtulas. Em 19 de fevereiro de 1879, fora emanada uma lei por influência maçônica, onde secularizava todos os cemitérios. Com a Proclamação da República em 1889, com uma decisão unilateral do governo provisório que separou a Igreja do Estado, todos os cemitérios deveriam a ser administrados pelo Poder Civil. No entanto, o cemitério de Cesário Lange continuou a pertencer à Igreja. Foi só em 20 de setembro de 1984 que a Diocese de Sorocaba, diante desta excrescência jurídica, entregou este patrimônio paroquial à administração da Prefeitura Municipal de Cesário Lange sem nenhuma indenização. Para se chegar a esta solução, não foram poucos os mal-entendidos entre a Igreja e a administração municipal. Para se ter uma idéia, desde de 1965, começaram os contatos entre as duas partes, somente 19 anos depois, através do bispo Dom José Lambert e o prefeito Aristides Perez, conseguiu-se por fim a tal situação insólita. No dia 20 de novembro de 1984, através do Dr. Dantas, advogado da Mitra Diocesana, D. José Lambert doava o cemitério à cidade. A área doada pela Igreja à Prefeitura foi de 4.551,57 metros quadrados.

Resolveu-se o problema jurídico, mas não o prático: o da falta de espaço no cemitério local, pois o aumento de terreno feito pela Prefeitura foi pequeno e há muito não existe mais espaço para novas sepulturas.

1) O Pe. Anibal Gravina foi ordenado sacerdote em Taubaté por D. Epaminondas Nunes de Ávila e Silva em 20 de dezembro de 1919, ele foi aluno do Colégio Santo Inácio (jesuíta) no Rio de Janeiro.
2) Durvalino Batista de Almeida, filho de José Baptista de Faria (1860-1942) e de Maria Inocência de Almeida (1865-1941) nasceu em Laranjal Paulista em 11-08-1889 e faleceu em Cesário Lange em 07-03-1959 aos 70 anos, às 2h00. Casou-se em Laranjal Paulista com Francisca Rodrigues de Almeida, nascida em 20-02-1894 e falecida em 12-06-1975, filha de João Baptista de Almeida (João Venâncio) e Maria Rodrigues de Jesus (Maria Pereira). Foram seus filhos: João Batista Sobrinho que se casou com Maria José Martins; Lígia Batista Rodrigues que se casou com Manoel Rodrigues; Orlando Batista de Almeida que se casou com Orlanda Albano; Luiza Pereira Novaes que se casou com Anísio Pereira Novaes; Julieta Batista Galavoti que se casou com José Galavoti; Alberto Batista de Almeida que se casou com Carmen Ayres Mendes de Almeida; Maria Batista Chagas que se casou com Elzulino Chagas; Elza Batista Mariosi que se casou com Francisco Mariosi e José Francisco Batista de Almeida que se casou com Catarina Paes.
3) José Vieira de Miranda (1830-1912) era filho de João José Vieira de Miranda (João José dos Passos) e Delfina Vieira de Miranda e natural de Cotia. Foi casado com Ana Victória Pereira Dias (1857-1921) e teve os seguintes filhos: Joaquim Mamede Miranda (1877-1958) casado com Gertrudes Virgínia da Silva (1882-1978), José Dias (Juca) Miranda (1885-1977) casado com Gertrudes Ribeiro da Silva (1890-1986), Antônio (Tó) Dias de Miranda(1897-1988) casado com Durvalina Vieira de Miranda (1902-1955), viúvo casou-se pela segunda vez em 1957 com Maria Leme de Miranda (1931). Seus outros filhos foram João Dias de Miranda casado com Ana Teles, Vitória Miranda casada com Benedito Fogaça Leite, Maria Izabel de Miranda casada com Cesário (Cesarinho) da Silva Campos, Helena Miranda (1894-1923) casada com Juvenal de Arruda Campos (1888-1977), Gertrudes Miranda casada com Delfino Teles, Delfina Vieira Miranda (1898-1927) casada com Dácio Vieira de Camargo (1893-1966), Eulália Miranda casada com Juvenal de Camargo, Ana Miranda casada com Cesário Proença.

4) Porfíria Maria da Conceição (1862-1938) era viúva de Francisco Ribeiro da Silva (1855-1906). Ela era filha de Francisco Antônio da Costa Carlos e de Gertrudes Lisboa de Almeida e nascera em Tatuí. Foram seus filhos: José (Gé) Ribeiro casado com Izabel Menezes, Cesário (Cesarinho) da Silva Campos casado com Maria Izabel Miranda, Zoraide casada com Jorge Fiusa, Maria (Nhá Marica) casada com Silvino Antunes, Gertrudes (Tudinha) casada com Joaquim Mamede de Miranda, Elisa casada com Fenelon (Nenê) Vasconcellos Leite. Ela era irmã de Maria do Carmo de Almeida (1870-1948) casada com seu cunhado Cesário da Silva Ribeiro, de Maria Inocência (Nhá Marica) de Almeida (1865-1941) casada com José (Juca) Baptista de Faria (1860-1942), e de Ana (Aninha) da Costa Carlos casada com Bonifácio de Arruda. Ela tinha também dois irmãos: Cesário Carlos de Almeida e Basílio Carlos de Almeida (Carro).

2 - A origem da Paróquia de Santa Cruz

A capela que funcionava no povoado de Passa Três estava sob a jurisdição e a cura do vigário da Paróquia Nossa Senhora da Conceição de Tatuí. Esta paróquia fora criada da Freguesia de Itapetininga devido a uma reinvidicação dos moradores dos bairros Tatuu, Guaxingu e Pederneiras Pretas, devido a grande distância que havia da freguesia de Itapetininga, por Sua Alteza Real, o Príncipe D. Pedro (futuro imperador do Brasil) a pedido do bispo de São Paulo, Dom Mateus de Abreu Pereira (1795-1824), conforme o livro de Registro e Alvarás, registrado à folha 196, do Livro XI, no Rio de Janeiro no dia 05 de março de 1822. A dita freguesia, conforme o alvará de Sua Alteza Real, deveria ser erecta com a invocação de Nossa Senhora da Conceição no povoado de Tatuí.

Em 24 de outubro de 1908, por decreto do Presidente do Estado de São Paulo, dr. Manoel Joaquim Albuquerque Lins, Lei 1.137, criou-se um Distrito de Paz na Capela do Passa Três com o nome de Distrito de Cesário Lange, nome este dado por sugestão de João Mendes de Almeida, para homenagear o finado professor Cesário Lange Adrien. José Rodrigues Fernandes e dois alagoanos cooperaram muito para isso: Aristides Vasconcellos Leite (1), que exercia farmácia e morava no povoado de Passa-Três e Aureliano da Nóbrega e Vasconcellos, que residia em Botucatu. Os primeiros juizes de paz foram respectivamente: Joaquim Ribeiro da Silva (1850-1928), José Rodrigues Fernandes e Manoel Pereira de Almeida, empossados por Dr. Antônio do Amaral Vieira e Joaquim Assunção Ribeiro no dia 20 de janeiro de 1909.

Neste mesmo ano, acontecia um fato importante para a região. O Santo Padre Pio X (1903-1914) criava uma nova diocese com sede em Botucatu em 07 de junho de 1908, desmembrando-a da diocese de São Paulo. O Papa nomeou como bispo da nova diocese a Dom Lúcio Antunes de Souza (1863-1923). De repente, a sede da diocese de muito longe (São Paulo) ficou próxima (Botucatu). Realmente, em 18 de agosto de 1909, Dom Lúcio fazia sua primeira visita pastoral a Tatuí. Aproveitou-se disso, alguns moradores do distrito de Cesário Lange, talvez com interesse de se distanciarem da influência do município de Tatuí, passaram a trabalhar junto ao novo bispo para que se criasse uma paróquia com vigário próprio em Cesário Lange. Empenharam-se neste mister Aristides Vasconcellos Leite e Aureliano da Nóbrega Vasconcellos junto a Mons. Paschoal Ferrari (vigário geral da diocese) em Botucatu para conseguir tal feito. Realmente no dia 20 de fevereiro de 1914, o bispo Dom Lúcio Antunes de Souza criou uma nova paróquia, conforme o decreto abaixo (conservou-se a ortografia original).

Parochia de Cesário Lange

Dom Lucio Antunes de Souza, por mercê de Deus e da Santa Sé Apostólica, Bispo de Botucatu.

Aos que o presente Decreto virem saudação e benção do Senhor.

Fazemos saber que, tendo Nós em vista o bem espiritual dos Nossos amados diocesanos, usando das atribuições que Nos confere o S. Concilio de Trento (Sés. XXI. De Refor.) por Nossa autoridade ordinária, e delegada, se preciso for: Havemos por bem de desmembrar e separar da parochia de Tatuhy a circumscripção comprehendida entre os limites abaixo indicados, na qual erigimos e canonicamente constituímos uma nova parochia, que dedicamos á Santa Cruz. Seus limites, começando na Cruz Vermelha na estrada de Tatuhy a Botucatu, dahi seguem por esta estrada até o rio Guarapó; este até a barra do rio Sorocaba, e por este até às divisas de Tatuhy com o município de Tietê; dahi até os limites entre os municípios de Tatuhy e Pereiras e por estes limites até a Cruz Vermelha aonde tiveram começo. À esta parochia de Cesário Lange novamente creada, dividida e desmembrada da de Tatuhy, concedemos pleno direito e faculdade para ter Sacrário em que se conserve o Santíssimo Sacramento da Eucharistia, diante do qual arderá sempre, dia e noite, uma lâmpada accesa, pia baptismal e todos os mais direitos, privilégios, honras e distincções, insígnias e distinções de uma egreja parochial. O Reverendo Parocho respectivo haverá todos os emolumentos, proes e perçalços que legitimamente lhe pertencerem de pleno accordo com a Tabella do Bispado. Este será publicado em um domingo ou dia santo à estação da Missa conventual tanto na matriz da nova parochia como na de que foi desmembrada, afim de que chegue ao conhecimento de todos, do que se passará certidão no verso deste; e para a todo tempo constar, será registrado em Nossa Camara Ecclesiastica, no livro do Tombo de ambas as parochias, e mais partes onde convier.

Dado e passado em Nossa Camara Ecclesiatica de Botucatu, sob Nosso Signal e Sello de Nossas Armas aos 20 de Fevereiro de 1914. E eu Frei Modesto Gonçalves de Rezende, Secretario geral do Bispado, o fiz e subscrevo.

† Lucio, Bispo Diocesano.
(transcrição do Livro do Tombo 1-3)

O pároco de Tatuí, responsável então pela capela Santa Cruz de Cesário Lange era o Padre cônego João Correia de Carvalho (nascido em 14 de fevereiro de 1869 e falecido, nonagenário, em Tatuí em 20 de agosto de 1960). Com a criação da paróquia a igreja de Cesário Lange ganharia também um pároco próprio. Enquanto não se nomeava o vigário, a paróquia foi confiada ao Pe. José Gorga (2). Realmente, a primeira missa na humilde igrejinha da nova paróquia foi celebrada pelo Padre cônego José Gorga, então, vigário da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição de Pereiras (criada em 15 de março de 1876), no dia 22 de fevereiro de 1914 (era o domingo da Qüinquagésima), e que se tornou o encarregado da nova paróquia até a designação do primeiro pároco, que foi o Pe. Pedro Gravina, nomeado através de uma provisão lavrada em 25 de março de 1914.

Assim, no dia 05 de abril de 1914, às 10h00 da manhã (Domingos de Ramos), diante de “uma grande multidão”, depois de lida a provisão episcopal, Padre Gravina fez uma ligeira locução, saudando os seus paroquianos e celebrou a sua primeira missa paroquial. Foram testemunhas da posse do primeiro vigário os senhores Horácio Vasconcellos Leite e Domiciano Rodrigues Paulino. Contava, então, o Pe. Gravina 57 anos de idade quando aqui chegou. Quase de imediato, pôs-se a organizar a vida religiosa da paróquia. No dia 1.º de maio de 1914, ele abençoou a imagem da Padroeira do Brasil, Nossa Senhora Aparecida, uma doação de Domiciano Rodrigues Paulino (3).

Em 1916, Pe. Gravina informava que a vila de Cesário Lange tinha 52 casas e toda a paróquia teria umas 5.000 almas. Havia 38 meninos e 39 meninas que freqüentavam as aulas de catecismo. Essas aulas eram ministradas às 17h00, aos meninos às terças-feiras e às meninas nas quintas-feiras. Todo dia à tarde, reza-se o terço na matriz, sendo que nas quintas-feiras e domingos há também bênção do Santíssimo Sacramento. Naquele ano, o mesmo vigário informava que houvera 209 batizados, 35 casamentos e 103 óbitos. O vigário fundou a Irmandade do Rosário Perpétuo em 02 de agosto de 1914, em 03 de outubro de 1915 foi feita sua ereção canônica, tendo como primeiro presidente Maria de Vasconcellos Leite e o Apostolado da Oração no dia 25 de junho de 1915, este último tendo como primeira presidente Maria Thereza de Almeida e como secretário o prof. Francisco Mendes de Almeida (1859-1930).

Mais tarde, nos anos trinta, durante o paroquiato de Padre Olegário Barata se criaria outras associações religiosas como a Pia União das Filhas de Maria (18 de junho de 1933), os Congregados Marianos (30 de maio de 1935) e a Cruzada Eucarística (01 de novembro de 1936). Diante da falta de quase tudo para a dignidade do culto católico, procurou Pe. Gravina adquirir o indispensável. Em 30 de setembro de 1915, chegou um "harmonium", adquirido através de subscrição dos paroquianos. A missa aos domingos era celebrada às 10h00 com explicação do Evangelho e às 13h00 havia catecismo para as crianças. À tarde, havia explicação de catecismo aos adultos, orações e bênção do SS. Sacramento. Entre os dias 06 a 18 de julho de 1921, realizaram-se as primeiras missões na Paróquia Santa Cruz. Foram pregadores: Frei Virgílio e Frei Timóteo.

Além das festas próprias do ano litúrgico, a paróquia tinha outras três festas: Santa Cruz, Sagrado Coração de Jesus e depois também, São Roque. Em 1923, a população da paróquia era de aproximadamente 4.124 almas (4), estando a maioria na zona rural. Também o povoado crescia e se organizava.

Funcionava já então as “Escolas Reunidas” num prédio situado na atual Rua Joaquim Ribeiro da Silva na altura do número 811 (antigo 199). Por exemplo, em 1924, a escola tinha 132 alunos, sendo 80 meninos e 52 meninas. O diretor da escola era o prof. Licínio Alves Cruz. Havia também uma escola no Bairro Aleluia dos Mirandas e se criou, nesta mesma época, uma outra escola na Fazenda Velha. Havia também em Cesário Lange um grupo de escotismo que era liderado pelo diretor da escola, comandado pelo anspeçada Procópio Franco e tinha como instrutor o Sargento Ferraz.

Pe. Gravina procurou também reunir a população para construir uma igreja de verdade no lugar daquela igrejinha de pau e barro que media 13,6 metros de comprimento por 11 metros de largura. Efetivamente, já em 15 de agosto de 1917, foi abençoada a "capela-mor" restaurada. No dia 1.º de fevereiro de 1919, o bispo nomeou a seguinte comissão para as obras da igreja matriz: Joaquim Ribeiro da Silva, Aristides Vasconcellos Leite, Domiciano Rodrigues Paulino, José Rodrigues Fernandes, Francisco Mendes de Almeida, João Mendes de Almeida, Vicente Ribeiro da Silva e João Casemiro Martins. Foram pedreiros Domingos Bosso e Joani Bosso (5), ambos de Tatuí. No dia 1.º de julho de 1920, deu-se o começo da demolição da modesta fachada da igrejinha para a construção de uma mais sólida, que terminou em fevereiro de 1921. Gastou-se a importância de 23.840$000 e a paróquia ficou com uma dívida de 6.000$000, que logo foi paga.

No dia 26 de dezembro de 1920, com uma grande festa a qual assistiu quase toda a população da paróquia, foi abençoado e em seguida içado num pequeno campanário um sino de 207 kg, uma dádiva de Domiciano Rodrigues Paulino. Este sino é o mesmo que está na torre da matriz. A antiga torre da igreja foi demolida entre os dias 09 a 16 de julho de 1967, já no término da construção da atual igreja matriz. Em 22 maio de 1921 foi inaugurada a nova fachada da igreja. Urgia, no entanto, reconstruir o corpo da igreja que era muito pequeno e ameaçava desabar. Para tanto, em julho de 1924, Pe. Gravina criou uma comissão composta pelo cel. Joaquim Ribeiro da Silva, Cesário Ribeiro da Silva e João Mendes de Almeida que naquela data já haviam conseguido uma subscrição da população da importância de 8.500$000 para tal empreendimento.

Temos uma outra notícia do jornal tatuiano "O Progresso de Tatuhy" de 24 de janeiro de 1926, que "um grupo de moços amadores se constituiu para angariar recursos para as obras (de construção do corpo da igreja) e para tanto, tem ensaiado e levado à cena diversas peças de teatro, espetáculos que têm atraído grande concorrência e agradado muito". Realmente no dia 1.º de junho de 1926, foi demolido o velho corpo da matriz e a 31 de outubro do mesmo ano, estava já reconstruída de novo a sua nave. A capela mor (o presbitério) e as sacristias receberam novas reformas e assim foi benzido o novo edifício.

Um exemplo das dificuldades de então, temos uma descrição da primeira visita pastoral do bispo ao seu rebanho de Cesário Lange, que aconteceu entre o 07 a 12 de março de 1914, isto é, quinze dias após a criação da paróquia. Dom Lúcio Antunes de Souza saiu de Bella Vista de Tatuhi (até 1919, este foi o nome do distrito de Porangaba) às 12h00, chegando às 16h00 em Cesário Lange. Para a esquecida vilinha, a visita de um sucessor dos apóstolos consistiu num acontecimento único. Quando a comitiva do bispo chegou ao Ribeirão Aleluia, encontrou um numeroso grupo de cavaleiros que o saudaram entusiasticamente, entre eles Aureliano Mascarenhas de Camargo, Cândido José de Oliveira (prefeito de Tatuí), liderados pelo Pe. José Gorga, o encarregado da paróquia e seu irmão Luiz Gorga. Chegando à vila, foi acolhido por uma comissão presidida por Aristides Vasconcelos Leite, com fogos, aclamação do povo que atiravam flores, alunos da escola com seu professor e uma excelente banda de música. Certamente, se tratava da banda de Francisco de Mattos (6), morador da Fazenda Monte Alegre e que ensinava música entre os habitantes da vila. Houve missas, pregações, confissões. Houve mais de 15 casamentos regularizados e ao todo 710 crismas, entre adultos e crianças. No dia 13, à tarde, o bispo partiu para visitar a capela de Quadra, “filial da matriz de Tatuí”.

O bispo deixou registrada a sua emoção e saudade da gente de Cesário Lange, que o acompanhou até Quadra. A atenção do bispo em sua visita de cinco dias à humilde vila conquistou os seus moradores, de maneira que se criou quase uma tradição em relação a cada visita pastoral do bispo, que nada mais era que uma reminiscência do antigo padroado, onde o bispo era considerado um príncipe. A tradição essa que durou até o final do Concílio Vaticano II, quando o bispo de então, Dom José Melhado Campos orientou os vigários que dispensassem todos esses eventos e que a visita pastoral do bispo se resumisse apenas ao seu aspecto religioso.

Entre os dias 25 e 28 de fevereiro de 1918, Dom Lúcio Antunes de Souza fez sua segunda visita pastoral à paróquia de Cesário Lange. Não foi menos apoteótica a visita. Uma comissão presidida por Joaquim Ribeiro da Silva, Domiciano Rodrigues de Machado (sic), Joaquim Mamede de Miranda e grande número de cavaleiros foram encontrá-lo a uma légua de Cesário Lange. Desta vez, o bispo vinha de Pereiras, onde Domiciano Rodrigues Paulino foi buscá-lo em sua carruagem. Satisfeito ficou o bispo com a melhora geral da paróquia. Ao todo, ele administrou 361 crismas. Suas visitas pastorais eram quase uma "missão", pois era acompanhado de diversos sacerdotes, que visitavam os doentes, pregavam, ouviam confissões, regularizavam uniões conjugais.

No dia 25 de junho de 1918, aqui chegou para substituir Pe. Gravina, que fora transferido para a paróquia de Pirajuí, o Pe. João Baptista da Palma. No entanto, três meses depois, no dia 06 de outubro, Pe. Gravina recebeu uma nova provisão do sr. bispo para reassumir a Paróquia Santa Cruz em Cesário Lange, devido a problemas de saúde que o acometeram na nova paróquia. Decisão essa acatada com indisfarçável alegria pelo velho sacerdote. Padre Gravina era doentio e se socorria amiúde com os remédios que lhe prescrevia Aristides Vasconcellos Leite.

Entre os dia 24 de abril a 1.º de maio de 1920, Dom Lúcio fez sua terceira e última visita pastoral a Cesário Lange, vindo, outra vez, de Bella Vista de Tatuhi (sic), nesta época, o nome oficial deste distrito era já Porangaba. Elogia o bispo Pe. Gravina, como um pároco exemplar e se queixa que o bom povo do lugar gosta mais da festa do que dos sermões. Crismou, desta vez, 428 pessoas e legitimou quatro uniões matrimoniais. Tais visitas eram uma odisséia e tanto para o prelado, que embora não fosse muito idoso, não gozava de boa saúde (sofria de nefrite). Na noite de 20 de outubro de 1923, a pequena vila de Cesário Lange foi surpreendida pela notícia do falecimento do estimado bispo, acorrida em Botucatu no dia anterior às 14h00. Uma nova etapa da vida paroquial estava para começar.
***
1) Aristides Vasconcellos Leite (1850-1925) era farmacêutico prático, tinha sua botica no largo em frente à igreja, onde hoje se encontram as ruas Pe. Gravina e José Vieira de Miranda. Ele era natural do estado de Alagoas, filho de José Nóbrega Vasconcellos e de Maria das Graças Leite e que teria deixado sua terra junto de seus dois irmãos Aureliano Nóbrega Vasconcellos Leite (advogado, falecido em Botucatu) e Francisco Nóbrega Vasconcellos Leite (farmacêutico) ao envolverem-se numa disputa com um vizinho de suas terras por causa de um cavalo e que teria resultado na morte do mesmo. Sua mãe os teria persuadido de se migrarem. Casou-se Aristides Vasconcellos Leite com Maria Alves de Lima (Nhá Mariquinha). Faleceu em 12 de maio de 1925. Foram os seus filhos: Aristides (Bibido) que se casou com Ana Rosa, Horácio que se casou com Adelina Alves, Aristarco (Zezé) que se casou com Delfina (filha de Domiciano Rodrigues Paulino), Fenelon (Nenê) que se casou com Elisa (filha de Francisco Ribeiro da Silva), Aristhéia (Tetéia) que se casou com José Vieira de Camargo, viúva se casou com Antônio Mathias Duarte e Maria (Teinha) que se casou com João Mendes de Almeida. Aristides Vasconcellos Leite, se diz, estudava medicina quando se migrou para Passa Três. Certamente, ele não era médico. O primeiro médico que visitou Passa Três foi o Dr. Emílio Ribas, que por volta de 1894 atendeu a uma jovem, filha de Joaquim Mendes de Almeida e que veio falecer em seguida como diagnosticara o médico. O Dr. Emílio Ribas (1862-1925) esteve até 1895 em Tatuí, onde Manuel (Manduca) Guedes Pinto de Mello (1853-1927), então um dos homens mais ricos do Brasil, o trouxera e lhe construíra uma casa.

2) Pe. Gorga era já um “velho sacerdote” e prestava excelentes serviços à Diocese de Botucatu. Residia habitualmente em Porangaba (onde se meteu em contendas políticas bastante discutidas), mas atendia também Pereiras, Guareí e Bofete. Era um padre incansável numa época que não havia estradas e todo o percurso era feito a cavalo. Mons. Castanho (1904-1981), o notável historiador sorocabano, nascido em Guareí e conhecido nos meios literários e históricos como “Aluísio”, “Arnóbius” ou “Aluísio de Almeida” deixou em suas recordações um “retrato” deste destacado sacerdote. “Alcancei-o quando eu tinha cinco anos de idade (1909), agradou-me e me deu um níquel, mas depois sempre vi o seu retrato lá em casa, aliás, casa que ele benzera ainda nova. Os meus sempre falavam dele”. Continua Mons. Castanho em suas memórias a respeito do Pe. Gorga, falando de sua cativante pessoa: “Assim mesmo, viajando tanto não podia passar quieto os dias de semana. Exercitava-se na habilidade das mãos. Com um simples canivete trabalhava a madeira”. Dom José Carlos de Aguirre (1980-1973), primeiro bispo de Sorocaba, escreveu em seus papéis pessoais que Pe. Gorga morreu “avulso” em Conchas no dia 07 de julho de 1926, onde residiam os seus parentes. (Nota fornecida por Pe. João Carlos Orsi, da Arquidiocese de Sorocaba). Mais detalhes sobre o Pe. Gorga encontra-se no capítulo sobre as biografias dos párocos de Cesário Lange, embora, ele jamais tenha ocupado tal cargo. Foi só um encarregado por alguns dias da nova paróquia, exatamente 33 dias.

3) Domiciano Rodrigues Paulino foi um dos maiores patronos da Paróquia de Cesário Lange. Nasceu em Passa Três em 1859, filho de José Rodrigues de Pontes e Maria Paulina do Espírito Santo. Casou-se com Maria Rosa da Conceição, falecida em 1938, com quem teve os seguintes filhos: Cesário, Roque, Domitília, Gertrudes, Inez, Gomilha e Delfina Rosa da Conceição, casada com Aristarco (Zezé) Vasconcellos Leite. Viúvo, aos 83 anos de idade, casou-se apenas no religioso com Hortência Maria Fernandes no dia 22 de junho de 1943, assistido pelo Pe. João Ev. Betting,c.ss.r. Domiciano faleceu no dia 27 de abril de 1950, às 24h00 na Fazenda Monte Alegre do Paraíso aos 91 anos.

4) Este número parece um tanto inflacionado, ainda nos anos 30 serão os mesmos! Aliás, em 1916, Pe. Gravina, como foi visto acima, escrevia que se falava que na paróquia havia 5.000 almas (Livro do Tombo 1, 10). Parece que alguns moradores primitivos de Cesário Lange para convencerem o bispo da necessidade da criação da paróquia tenham exagerado quanto ao número real de seus habitantes. Sem dúvida, havia uma motivação política para tanto. Tratava-se, enfim, de um número aleatório sem nenhuma comprovação estatística.

5) Esta informação foi dada oralmente por Aristides Mendes (Tidão, nascido em 1913 e que faleceu em Tatuí em 2007).

6) - Francisco de Mattos, nascido por volta de 1890, era, o que parece, filho de José Ignácio de Mattos, que por esta época adquiriu a Fazenda Monte Alegre, que em meados dos anos 20 foi vendida a seu genro Francisco Bonifácio de Arruda, natural de Laranjal Paulista, e a Raul Arruda, de Tietê. Francisco de Mattos por volta de 1910 começou a ensinar música a alguns habitantes da vila de Passa Três. Consta terem sido seus primeiros de seus alunos os jovens Umberto Beltrami e João Xavier da Silva (1899-1975). Outros seus alunos foram: Agenor de Arruda, José Vieira de Camargo, Vicente Vieira de Camargo (1851-1967), Aristarco (Zezé) Vasconcellos Leite (1890-1945), José Fortunato, Antônio Antunes da Silva (Tonho do Silvino) e outros. Francisco de Mattos, que faleceu aí por 1980, revelou que entre os antigos moradores de Cesário Lange, os que mais o ajudaram a criar a banda musical foram Benedito Monteiro, Joaquim Ribeiro da Silva, Horácio Vasconcellos entre outros.

1 - A origem da capela e vila da futura Cesário Lange

Por volta de 1850, um certo José Justino Inocêncio (1), residente em Sorocaba, vendeu suas terras incultas próximo a um lugar chamado Passa Três na altura do caminho de tropeiros, que de um lado se dirigia aos Braganceiros (Pereiras) e de outro ao sertão de Santo Antônio do Rio Feio (Porangaba) em quinhões a alguns sertanistas, entre eles: José Mendes de Almeida (2), Joaquim de Almeida Leite, Antônio Pires de Campos, Antônio Leite de Miranda, José Mariano Pinto, Bento Casimiro, Vicente da Silva Ribeiro (3), Severino Alves de Oliveira, Antônio Nunes da Silva, André Rodrigues Machado, José Pedro Fernandes e Joaquim Corrêa Fernandes e outros. Estes foram os primeiros proprietários de terras do atual município de Cesário Lange, que nos chegaram pela tradição, já consolida pelos anos 30 do século XX.

Por volta de 1872, pensou José Mendes de Almeida em erigir uma capela, onde os moradores daquelas matas se pudessem reunir e fazer exercícios religiosos no lugar chamado comumente de Passa Três, assim chamado, ao que parece, devido a um ribeirão que ali há com este nome (4). Este ribeirão nasce na altura da Fazenda Monte Alegre e deságua no Ribeirão da Onça. Provavelmente, este nome do ribeirão é devido ao fato que o mesmo cortava, então, por três vezes os confins meridionais da imensa sesmaria do “Ribeirão da Onça”, que havia pertencido a João Antônio Gonçalves, Bento Antunes de Camargo e a uma mítica personagem, Francisca de Paula Leite de Barros (Nhá Chica Brava), que compreendia partes de terras hoje pertencentes aos municípios de Laranjal Paulista, Tietê e Cesário Lange. A sede das terras desta latifundiária, Nhá Chica Brava, lendária por sua crueldade para com seus escravos, seria próxima ao Bairro dos Pedros, que faz hoje parte da Fazenda Nova Esperança. Com a abolição da escravatura, Chica Brava teria se retirado para Tatuí, onde morreu (5). Antes, vendeu partes de suas terras aos Guedes de Tatuí e deixou outras partes de suas terras a alguns de seus herdeiros, entre eles, Antônio Alves e filhos. Uma parte de suas terras foi completamente abandonada, que deu origem ao atual Bairro da Fazenda Velha. No início do século XX, posseiros se instalaram nela, se dedicando à agro-pecuária e até hoje a maioria de seus moradores assim permanecem, sem títulos de propriedade. O Atual distrito da Fazenda Velha é uma parte obscura, ainda, da história de Cesário Lange.

Para erguer tal capela, José Mendes de Almeida adquiriu com auxílio de outros moradores por 50$000 de Antônio Furquim de Oliveira e de sua mulher Francisca um terreno próximo ao Ribeirão Passa Três, onde com a ajuda de alguns companheiros ergueu uma capelinha de pau e barro em honra à Santa Cruz. Para tanto contou com os serviços de carpintaria de Pedro Rodrigues Machado e João Rodrigues Machado, que também prestaram algum serviço voluntário. Na ocasião, Severino Alves de Oliveira doou um terreno fronteiro à capelinha para servir-lhe de pátio com 1.600 braças quadradas (aproximadamente uns 7.744 metros quadrados), em que se andasse em procissões e o povo montasse barracas, botequins e paliçadas em dias de festas que ali se faziam mensalmente. Terreno este, onde, hoje se localiza a Praça Pe. Adolfo Testa.

A 12 de dezembro de 1878 (uma quinta-feira), o Padre cônego Demétrio Leopoldo Machado, vigário de Nossa Senhora da Conceição de Tatuí, paróquia que pertencia à diocese de São Paulo, celebrou a primeira missa na capelinha Santa Cruz de Passa Três. Também, nesta ocasião, realizou-se ali o primeiro batizado, o de Joaquim Mendes de Almeida (Nhosinho), filho de Joaquim Mendes de Almeida e Delfina Maria de Almeida, neto de José Mendes de Almeida.

A primeira casa edificada, à direita da capela, foi a de Pedro Rodrigues Machado (o carpinteiro) que deixou um espaço, que foi aproveitado para uma travessa. Aos poucos em volta da capelinha surgiria o povoado de Passa Três. Em 1879, o presidente da Câmara de Tatuí, Manuel Eugênio Pereira, acompanhado do seu fiscal, Cândido Pinheiro de Camargo, traçou as primeiras ruas da vilinha.

Desde 1879 já funcionava uma escola para crianças na casa de José Mendes da Silva (Nhô Gé), filho de José Mendes de Almeida na atual Rua dos Mendes. Esta “cadeira” de instrução foi criada a pedido de José Mendes de Almeida com o auxílio do deputado José Lisboa de Almeida, pois pertenciam ambos ao Partido Conservador (mendistas) que era chefiado em São Paulo pelo grande jurisconsulto João Mendes Almeida. Foram professores da dita escola: Cesário Lange Adrien (1843-1899), que tomou posse da cadeira da escola de Passa Três no dia 20 de agosto de 1879 e o leigo, também chamado “professor de palácio”, Francisco Mendes de Almeida (1859-1930), irmão de Nhô Gé e filho de José Mendes de Almeida. Pe. Olegário Barata, cinqüenta anos depois definirá o professor Cesário Lange Adrien como um "espírito lúcido, humanitário e progressista" (Livro do Tombo 1, pg 46).

Por essa época, o mesmo José Mendes de Almeida, junto então com o professor Cesário Lange Adrien e José Francisco de Oliveira, resolveram ampliar a capelinha Santa Cruz. Usaram-na como capela-mor da igrejinha que se construía com um aumento de 18 metros no comprimento e com 11 metros de frente, aproximadamente. Foram executores os mesmos carpinteiros já citados acima, auxiliados pelos pedreiros: José Sommerhauzer e Idelfonso Antônio de Moraes. A pequena igreja foi benta em dezembro de 1890, em virtude da provisão do mesmo mês. Era uma pequena capela, tosca, feita de pau e barro.Também, adquiriu José Mendes de Almeida por meio de seu representante o professor Cesário Lange Adrien de João Wagner, comerciante e de sua esposa Florinda Paes Wagner no dia 09 de outubro de 1893 por 1.200$000 uma casa com terreno próprio para o uso da igreja. No dia 15 de maio de 1919, o prof. Francisco Mendes de Almeida doará outro lote de terreno, anexo, com uma mina de água, avaliado então em 200$000. Estes lotes se tornarão o terreno da antiga casa paroquial na Rua do Comércio, alienada em parte em 1962 para se construir a atual.

Como o povoado crescia, fazia-se necessidade de um cemitério, até então, sepultavam os falecidos em Tatuí ou Pereiras (6), a capela Santa Cruz conseguiu para tal fim um terreno com uma área doada por Vicente da Silva Ribeiro (certamente, os pais dos irmãos Joaquim, Francisco, Cesário e Vicente Ribeiro da Silva) por volta de 1885. O cemitério tinha 625 braças quadradas (3.025 metros quadrados) e foi regularizado através de provisão própria (L.3 do Tombo de Tatuí, fls 3) no dia 04 de julho de 1894 e foi benzido como "campo santo" no dia 14 de setembro do mesmo ano. Este cemitério seria ampliado em 1922 através de doação de um lote anexo (um celamim de terra), feita por Porfíria Maria da Conceição (viúva de Francisco Ribeiro da Silva), doação esta regularizada em 1934. Em junho de 1936, Domiciano Rodrigues Paulino doou 20.000 tijolos para que se construísse um muro em sua volta, para substituir a tosca cerca de estacas que dava os limites ao cemitério.

Cesário Lange Adrien, um dos benfeitores da igrejinha Santa Cruz de Passa Três, foi transferido para Tatuí em 1897 como “inspector literário", onde faleceu em 29 de maio de 1899 com 54 anos de idade (7). Por esta época, também, já não mais vivia José Mendes de Almeida (falecido em 1895), o homem que por justiça deve dar-se o título não só de iniciador da futura Paróquia Santa Cruz, mas também de fundador da atual cidade de Cesário Lange. Na virada do século, a vila de Passa Três teria umas trinta casas dispersas e uma população de umas 150 almas.
***
1) Pe. Olegário da Silva Barata no Livro do Tombo 1, pg 46, em maio de 1933, informa que seu nome era José Bonifácio Inocêncio. Quanto à história pregressa à chegada dos primeiros moradores em Passa Três, ela é muito obscura e carece de ulteriores investigações. Seguindo o pesquisador porangabense Júlio Domingues, podemos levantar alguns dados. A mais antiga menção à ocupação de terras em nossa região foi relatada por Laurindo Dias Minhoto que descobriu que em 1609 um certo João de Campos e seu genro Antonio Rodrigues que receberam do donatário da Capitania de São Vicente uma sesmaria no distrito da vila de Nossa Senhora da Ponte (Sorocaba) numa paragem denominada Ribeirão de Tatuí. De acordo com o historiador Aluísio de Almeida, essas terras passaram para José de Campos Bicudo (nascido em Parnaíba em 1657) que as doou aos frades carmelitas de Itu e São Paulo e à Companhia de Jesus (jesuítas) para o estabelecimento de fazendas. As fazendas Paiol, Capela Velha e Santo Ignácio deram origem, respectivamente, a Tatuí, Guareí e Botucatu. Os jesuítas foram expulsos do Brasil por Pombal em 1759 e parte de suas terras passaram para Estanislau de Campos Bicudo de Itu. Segundo o Dr. Paulo Fraletti partes dessas terras permaneceram incultas, portanto voltaram à posse do governo como terra devoluta. Este pode ter sido o caso da sesmaria do Guarapó que compreendia o que é hoje Cesário Lange, parte de Tatuí e Pereiras. A sesmaria de José Justino Inocêncio seria remanescente desta última? Não sabemos. Uma coisa é certa, os primeiros moradores de Passa Três eram em sua maioria originários de Sorocaba e arredores. Isto é possível observando seus nomes. Nomes como Fernandes, Campos, Antunes Maciel, Paes, Barros, Mendes, Pedroso... muito comum entre nós são nomes de sertanistas sorocabanos, que aventuravam pelo sertão desde do século XVII em busca de ouro e fortuna, chegando a Curitiba e às Missões jesuíticas no sul e a oeste até Cuiabá, que foi fundada por um sorocabano.

2) José Mendes de Almeida (1815-1895) era natural da Província do Maranhão, se fixando, anteriormente, em São Roque e depois em Porto Feliz, onde se dedicou à agricultura. De lá teria se mudado ao adquirir terras próximas ao sertão de Passa Três. Outra parte de sua família se dedicou ao comércio em São Paulo e outra se fixou no Rio de Janeiro. É provável que o famoso jurista, político e historiador, João Mendes de Almeida (1831-1898), líder monarquista, nascido em Caxias, Maranhão e que deu nome à Praça João Mendes em São Paulo, como também o senador Cândido Mendes de Almeida (1818-1881) fossem seus parentes, ainda que distantes. O Pe. Olegário Barata em 1933, através de informações orais dos filhos de José Mendes de Almeida, informa que ele era monarquista mendista (justamente, a facção política que João Mendes de Almeida era líder em São Paulo). José Mendes de Almeida foi casado com Maria Luiza da Silva Mendes de Almeida e foram seus filhos: Inácio Mendes de Almeida (1842-1919) casado com Bernardina Rodrigues Cordeiro (1843-1925), Joaquim Mendes de Almeida (1843-1914) casado com Delfina Maria de Almeida (1853-1936), José (Nhô Gé) Mendes de Almeida ou da Silva (1849-1937), Maria (Nhá Lica) Mendes de Almeida (1851-1941), Antônio (Imão) Mendes de Almeida (1854-1921), Anna Luiza (Nh’Ana) Mendes de Almeida (1857-1934), Prof. Francisco Mendes de Almeida (1859-1930).

3) Vicente da Silva Ribeiro foi casado com Maria Fonseca Lisboa. Foram seus filhos, entre outros: Joaquim Ribeiro da Silva (1850-1928) casado com Maria Branco Ribeiro (1853-1936), Francisco Ribeiro da Silva (1855-1906) casado com Porfíria Maria da Conceição (1862-1938), Cesário Ribeiro da Silva (1863-1935) casado com Maria do Carmo de Almeida (1870-1948) e Vicente Ribeiro da Silva (1867-1942), casado com Carmelina Martins Vieira, viúvo se casou uma segunda vez com Maria Ernestina Ferraz de Almeida.

4) Quanto ao nome de Passa Três não existe nenhum consenso sobre sua origem. Além da hipótese acima, há outras. Num livreto semi-oficial impresso em julho de 1968 em Cesário Lange num trabalho conjunto da Prefeitura Municipal e das escolas, aparecia a hipótese tradicional para justificar tal denominação sobre os três rios que teriam que atravessar quem partia de Tatuí para chegar a estas paragens, isto é, o Ribeirão das Pedras ou dos Fragas, o Rio Guarapó e o Ribeirão Aleluia. Tese esta também defendida pelo historiador pereirense Dr. Paulo Fraletti (1993).

5) Há muitas estórias e lendas sobre Chica Brava que fora casada, segundo Paulo Fraletti, com um certo Antônio Sampaio. Era assim chamada pela maneira cruel como tratava os seus escravos. Quando da Abolição da Escravatura (1888), muitos deles permaneceram com seus antigos patrões, o mesmo não se deu com os de Chica Braba que a abandonaram, e que sem mão-de-obra teria ficado em séria dificuldade, o que fez que abandonasse suas terras. Conta-se que certa vez, para acabar com os piolhos que havia nos cabelos de uma sua escrava, teria feito derramar sobre a cabeça dela uma panela cheia de gordura fervente. Havia mesmo quem jurava que Chica Brava tinha rabo, numa alusão que teria ela parte com o diabo. Ela gostava muito de pescaria e quando os peixes apareciam em suas pescarias, o seu “ rabo”contorcia por baixo de suas saias de satisfação, é o que se dizia. A sesmaria do “Ribeirão da Onça” de Nhá Chica Brava pertencera a José Gurjão Baptista Lotrian, camarista de Tatuí em 1844, quando Tatuí tornou-se “villa”. José Gurgão Baptista Aranha Lotrian que foi proprietário da atual Fazenda Velha, outrora Sesmaria do Ribeirão da Onça, que era residência dos sesmeiros: João Antônio Gonçalves e Nhá Chica Brava (Francisca de Paula Leite de Barros) e Bento Antunes de Camargo.

6) Segundo uma antiga tradição no lugar onde hoje se encontra a capelinha da Cruz Preta no antigo caminho de Cesário Lange a Pereiras teria sido um cemitério, onde sepultavam pobres, crianças e escravos. Teria sido este o primeiro cemitério de Passa Três, embora fosse “clandestino”.

7) Cesário Lange Adrien nasceu em Sobradinho, município de Franca, em 25 de fevereiro de 1843, filho de André Lange Adrien (francês da Alsácia) e de Maria Benedita Munhoz, paulista de Cotia. Casou-se em Nazaré Paulista em 24 de abril de 1864 com Josefina Pereira Guimarães, de quem teve cinco filhos: Amélia, André, Gertrudes, Olímpia e Narcisa. Ficou viúvo em Nazaré em 13 de novembro de 1871. Casou-se pela segunda vez com Prescilina Xavier Ferreira (Sinhara) em 21 de novembro de 1877 em São Roque, de quem teve os seguintes filhos: Alfredo, Maria das Dores (Mimi), Estevam, Octávio (morto aos quatro anos de idade em 1890, está sepultado em Cesário Lange), Facunda, Júlia, Presciliana (Lili) e Cesária. Faleceu em Tatuí, aos 56 anos de idade, devido a um choque anafilático em 29 de maio de 1899. Está sepultado no cemitério de Tatuí ao lado de seu filho André Lange Adrien (1866-1924), que foi alvejado em 16 de março de 1924 em Tatuí ao embarcar num trem da Sorocabana por motivos políticos, morrendo na manhã seguinte (ele era candidato a deputado). Não há lápide, nada para identificar o local. Sobre os túmulos dos dois foi feito um passeio. O local, no entanto, é conhecido por muitos, inclusive pelo autor destas linhas. Cesário Lange fora aluno da primeira turma da Escola Normal de São Paulo por volta de 1861. Foi, depois, professor em Nazaré de 1862 a 1872, transferiu-se para Indaiatuba, depois para São Roque. Por volta de 1877, foi professor na Escola Pública do Palácio do Governo em São Paulo. Nesta época, dedicou-se ao jornalismo em “A Província de São Paulo” e “Correio Paulistano”. Devido a problemas de saúde (sofrera uma pneumonia) fora aconselhado a mudar-se de São Paulo. Foi nesta época que ele veio para Passa Três (1879). Além de monarquista, era também abolicionista e extremamente caridoso. Era conselheiro, uma espécie de confessor leigo e também coveiro. O historiador pereirense Dr. Paulo Fraletti encontrou um livreto escrito por um passatriense chamado Salvador Alves Rodrigues Machado chamado “A Perseverança”, editado em 1906 ou 1907 que traz algumas notícias interessantes sobre o professor, entre elas, que Cesário Lange Adrien exercia também o curandeirismo por meio de homeopatia. Não há nada de depreciativo para esta prática, já que na época, havia poucas escolas de medicina e a arte da cura era exercida por práticos que tinham conhecimentos rudimentares de farmácia. Por exemplo, o personagem principal de “Inocência” do Visconde de Taunay exercia a nobre profissão de “curandeiro”, o fato que transcrevemos abaixo se passa em 15 de julho de 1860 e a geografia do lugar descrito por Taunay devia ser muito próxima àquela de Passa-Três de então:

(Extrato de “Inocência”)

Tinha (Cirino) quando muito vinte e cinco anos, presença agradável, olhos negros e bem rasgados, barba e cabelos cortados quase à escovinha e ar tão inteligente quanto decidido.
(disse, então o jovem Cirino ao velho Pereira, quando perguntado sobre si, ao cavalgarem lado a lado),
- Eu ponho lhe já tudo em pratos limpos. Ando por estes fundões curando maleitas e feridas bravas.
- Ah! exclamou Pereira com manifesto contentamento, vosmecê é doutor, não é? Físico, como chamavam os nossos do tempo de dantes ... Mas, diga-me ainda... Onde é que vosmecê leu nos livros, aprendeu suas historias e bruxarias? Na corte do Império?
- Não, respondeu Cirino, primeiro no Colégio do Caraça; depois fui para Ouro Preto, onde tirei carta de farmácia.
E acrescentou com enfatuação:
- Desde então tenho batido todo o poente de Minas e feito curas que é um milagre.
- Ah! a sabença é coisa boa. . . eu também tinha jeito para saber mais do que ler e escrever, isto mesmo malmente; mas quem nasceu para carreiro, vira, mexe, larga e pega, sempre acaba junto ao carro. Com o que, entonces, vosmecê entende de curar?... (Visconde de Taunay – Inocência).

Uma explicação necessária

Não sou historiador nem tenho pretensões de sê-lo. Posso dizer também: “Meto ubi non semino” (Mt 25,26b), portanto “colho onde não plantei”. Este modestíssimo trabalho, certamente com muitas inexatidões, é fruto de um pedido feito pelo então pároco de Cesário Lange para que eu preparasse uma breve história da Paróquia Santa Cruz de Cesário Lange na passagem dos 90 anos de sua criação. Fi-lo com prazer, embora de maneira um tanto dolorosa. Tenho um grave problema que praticamente travou-me os dedos da mão direita. Digito só com a mão esquerda e assim mesmo muito lentamente e com muita dor. Alguns parágrafos digitados e às vezes toda uma semana sem uma linha sequer. É certo que tive ajuda de terceiros, por exemplo, minha irmã digitou-me trechos inteiros. Enfim o que poderia ser feito em trinta dias, levou mais de seis meses. Isto explica a brevidade em tocar certos assuntos e principalmente a forma fragmentada e claudicante do texto, pois literalmente, ele foi composto aos pedacinhos. Por outro lado, as coisas não estavam difíceis, pois há muitos anos anoto genealogias, informações encontradas, orais e escritas e venho publicando alguma coisa sobre a história, crônicas e "causos" de Cesário Lange, anonimamente, no jornal "Aliança Regional", principalmente sobre as origens de cidade. Quanto a isso, os recursos da informática mostraram utilíssimos, é só "copiar" e "colar", em seguida dar uma coerência ao texto. Trabalho maior foi em relação à obra de confrontar as informações com documentos dignos de fé, já que os boatos e as lendas em muitos casos superam em muito à realidade. Portanto, tive que correr atrás de alguma documentação confiável para ultimar o trabalho. O presente trabalho está dividido em três partes. As duas primeiras foram compostas com o máximo rigor possível e se há algo pouco acurado ou mesmo equivocado, é devido a erro de julgamento ou incompetência do autor. Quanto à terceira parte da obra, acrescentei algumas crônicas relativas aos inícios de Cesário Lange e que tinham alguma relação com a Paróquia Santa Cruz. Aí, dei-me a liberdade de acrescentar o que poderia ser provável na falta de documentação.

Decididamente, Cesário Lange não tem história, pelo menos uma história escrita. A única publicação que encontrei é um livreto semi-oficial impresso em 1968, que tem uma boa descrição física do município, mas quanto à história tem um viés áulico, mostra mais ou menos a situação de momento e é muito falho quanto à história primeva da cidade. A história de Cesário Lange ainda está por ser escrita. Tenho comigo algumas anotações que no futuro podem resultar em alguma coisa. Enfim, o meu propósito foi o de escrever uma breve história da Paróquia Santa Cruz de Cesário Lange e nada mais.

Oficialmente Cesário Lange foi fundado em 12 de dezembro de 1878 em volta de uma capelinha e só ganhou autonomia em 1.º de janeiro de 1960 com a posse de seu primeiro prefeito. Temos, portanto, um lapso de uns 80 anos em que a principal instituição, ainda que não fosse a única, foi a Igreja Católica, sendo que a paróquia surgiu 45 anos antes do município. Não é de se estranhar que ao escrever a história da Paróquia Santa Cruz esteja também contando alguma coisa da história da cidade. Por outro lado, não há, tem que se reconhecer, historiador "verdadeiro". Todos têm um ponto de vista, uma formação, uma ideologia e ainda que tentem passar por pesquisadores objetivos, não raro com pretensões de oniscientes e queiram fazer de sua versão a história definitiva. Abstenho-me de tais tentações. Reconheço a estreiteza de meu trabalho e talvez a inexatidão de alguns dados. Sou, apenas, um leigo católico e que procura contar a história sob o ponto de vista de um católico comum. Não sou teólogo ou coisa parecida, por isso não submeti este meu trabalho a nenhuma autoridade eclesiástica. Não que eu despreze um imprimatur ou nihil obstat, mas devido unicamente à despreocupação como me expressei sobre algum ponto de doutrina. Se sou bom cristão, trata-se de outra coisa (deixo isso ao julgamento e, acima de tudo, à misericórdia de Deus), procuro ser um fiel filho da Igreja, que me deu, depois de minha família, tudo.

Não canso de agradecer a Deus por tanto e às centenas de padres abnegados que conheci que me transmitiram tanta coisa. Pena não ter eu aproveitado tudo que eles tentaram passar para mim. Devo aqui deixar meus agradecimentos a todos aqueles que me apoiaram e, acima de tudo, emprestaram-me as suas memórias, e responderam com paciência minhas perguntas, inclusive vários sacerdotes que conhecem nossa história e deram seu depoimento, um de maneira especial devo citar: Frei Nuno Alves Corrêa, religioso carmelita, ilustre filho de nossa terra. Há dezenas de pessoas dentre nosso povo que me deram informações relevantes. Não dá para citar todos. Cito, apenas, meu pai, Alberto Batista de Almeida, que além de ter uma excelente memória, é também um bom contador de histórias. Não posso de deixar de citar D. Gorgônio Alves da Encarnação Neto, bispo de Itapetininga, à qual igreja particular pertence, atualmente, a Paróquia Santa Cruz de Cesário Lange e que me permitiu usar dos livros e documentos da paróquia, como também D. José Lambert, o arcebispo de Sorocaba e seu chanceler, o Pe. João Carlos Orsi, que me forneceram as anotações pessoais manuscritas de D. José Carlos de Aguirre sobre os vigários de Cesário Lange. Enfim, um agradecimento especial ao meu amigo norte-americano e grande pesquisador Charles N. Bransom Jr., que reside na Flórida, EUA e que pacientemente respondeu-me todas as minhas dúvidas sobre as linhagens apostólicas de tantos bispos e sacerdotes. Por fim, cito o Sr. Júlio Domingues, historiador da vizinha Porangaba e Dr. Paulo Fraletti, dedicado pesquisador e guardião das coisas de Pereiras, que me forneceram amavelmente excelentes informações.

Sob o signo da Santa Cruz, repito com o Apóstolo a respeito de Cristo: "Pois é preciso que Ele reine" (1Cor 15,25).

Cesário Lange, 03 de maio de 2004.
Fernando Antônio Batista de Almeida

Nota importante: Essa introdução foi escrita quando dei por terminado o meu trabalho em 03 de maio de 2004. Poderia, agora, fazer algumas atualizações, mas preferi não fazê-las. Pois, entre o final de sua redação e sua divulgação, houve tempo suficiente para muita coisa acontecer. A mais marcante e também mais dolorosa foi a morte de meu pai, que quando terminava meu trabalho já manifestava os primeiros sinais do mal incurável, que o levou para a Eternidade. Alberto Batista de Almeida, filho de Durvalino Batista de Almeida (1889-1959) e de Francisca Rodrigues de Almeida (1894-1975), nasceu em Cesário Lange em 23 de abril de 1925, onde foi batizado por Pe. Pedro Gravina. Foi ungido pelo sacramento da Crisma por Dom José Carlos de Aguirre em novembro de 1933. Quando criança foi coroinha do Pe. Olegário Barata (1933-1937). Embora muito inteligente e aplicado, só pode fazer o curso primário. Por toda a vida foi sempre um grande leitor de livros. Desde criança trabalhou na terra a qual sempre amou: cafezal, roças, pecuária, gado leiteiro. Assistiu a seu casamento com Carmen Aires Mendes de Almeida o Pe. Jorge Mouzizzano em 14 de janeiro de 1950. Nasceram-lhe quatro filhos: Teresinha (19-12-1950), Fernando Antônio (29-03-1952), José Maurício (21-09-1954) e Maria Cristina (05-05-1961). Homem discreto, humilde (abominava a publicidade, a hipocrisia), pobre, mas honrado, trabalhou na terra até maio de 2004, quando lhe acometeu doença fatal. Depois de duas penosas cirurgias e um tratamento que resultou ineficaz, entrou serenamente na Paz do Senhor em sua casa no meio dos seus, confortado pelos santos sacramentos da Igreja que um dia o batizara, às 15h20m do dia 04 de outubro de 2004. À sua memória, dedico este modesto trabalho.